ARTIGO 19 se manifesta contra o monitoramento das redes sociais de jornalistas e parlamentares

A ARTIGO 19 manifesta preocupação com o pedido de vistas do Ministro do Supremo Tribunal Federal, André Mendonça, na ADPF 765, realizado na última segunda-feira, 07/01. A ação, protocolada em novembro de 2020 pelo Partido Verde (PV), provoca o Supremo Tribunal Federal a se manifestar sobre a situação de inconstitucionalidade no monitoramento das redes sociais de comunicadores e parlamentares realizada pelas Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República e Secretaria de Governo do Governo Federal.

As ações tomadas pelas Secretarias consistem na contratação de empresas privadas com recursos públicos para a elaboração de “relatórios de monitoramento” de redes sociais de jornalistas e parlamentares, denunciadas pela Época também em novembro de 2020. São levantados na ação indícios de desvio de finalidade, além da grave lesão ao direito à liberdade de expressão, solicitando-se, entre outras medidas, a suspensão imediata da produção de tais relatórios e a investigação das medidas e da sua necessidade ao interesse público.

A relatora da ação, Ministra Cármen Lúcia, pontuou em fevereiro de 2022 que é inconstitucional o monitoramento encomendado pelas secretarias do Poder Executivo. Votando pela procedência do pedido e pela declaração de inconstitucionalidade de todo e qualquer ato das Secretarias de produção de relatórios de monitoramento sobre as atividades de parlamentares e jornalistas em redes sociais, a Ministra levanta importantes precedentes sobre a garantia da liberdade de expressão e declara que “impõe-se assegurar a liberdade de manifestação política, onde se constrói e se desenvolve o regime democrático. É no debate político que a cidadania é exercida com o vigor de sua essência”.

De fato, como expresso no voto da relatora, a realização de monitoramentos deste feitio viola seriamente o direito à liberdade de expressão e manifestação. Isso porque o exercício do direito depende de ambiente livre de censura ou amarras, conforme apresentado pelo texto da Constituição Federal brasileira. Essa compreensão é fruto das discussões que subsidiaram o processo de redemocratização do país, na saída do regime militar, que censurou e silenciou brutalmente comunicadores e políticos de oposição – inclusive, por meio de prisões, agressões físicas e psicológicas e outras formas de censura, que decorriam também de políticas de monitoramento e vigilância dos agentes dissidentes. 

No passo em que o Ministro André Mendonça apresentou pedido de vista, o julgamento foi suspenso. Vê-se com preocupação a movimentação do Ministro, que já integrou outros cargos sob indicação do Presidente da República, Jair Bolsonaro. É prerrogativa dos Ministros do STF o pedido de vista e análise dos casos que passam pela Corte, mas a demora em concluir este julgado provoca inegável prejuízo à liberdade de expressão, e exige presteza na decisão. Por esse motivo, o pedido de vista e a decorrente suspensão do julgamento podem atender ao não atendimento dos pedidos e ao prolongamento do tempo de julgamento. 

É também preocupante que este pedido de vistas, e o consequente atraso no julgamento, aconteça em ano eleitoral, quando as violações contra comunicadores que cobrem temas políticos tendem a se intensificar. Em um período como esse, toda e qualquer ação que pretenda calar ou impossibilitar a manifestação de caráter político (em especial, as de oposição a detentores de poder) deve ser tratada com cautela, sendo urgente a garantia de direitos para o acompanhamento livre e pleno do processo eleitoral pela Suprema Corte. Este é, historicamente, o fundamento da liberdade de expressão. 

É necessário ao Estado Democrático de Direito que seja permitido a comunicadores, ativistas e políticos que se expressem livremente em suas redes sociais, que hoje figuram como importante meio de disseminação e obtenção de informações – desde que respeitados os demais direitos fundamentais e humanos. O monitoramento, assim como outras políticas de vigilância, gera ambiente hostil à manifestação e expressão, causando insegurança e auto silenciamento por parte destes agentes – especialmente, daqueles críticos à gestão federal – e prejudicando os direitos à liberdade de expressão e manifestação. Estas políticas também indicam ações do Governo que se assemelham àquelas tomadas em períodos de ruptura democrática, abrindo portas para que novas violações ocorram, como possíveis atos de perseguição política, intimidação judicial ou mesmo a mobilização da máquina de ódio e desinformação que corriqueiramente ataca críticos ao governo federal por meio de plataformas de mídias sociais.

Por estas razões, a ARTIGO 19 expressa preocupação e solicita ao Ministro Mendonça e demais ministros do Supremo Tribunal Federal que avancem com o julgamento de maneira célere e sempre com a devida atenção à garantia dos direitos violados e à lisura dos gastos públicos – especialmente considerando o impacto do julgamento no livre exercício da liberdade de imprensa e do direito à crítica durante um ano eleitoral.

Icone de voltar ao topo