Liberdade de Expressão e de Imprensa enfrentam a maior ameaça do período democrático no Brasil

Organizações de liberdade de expressão e de imprensa ressaltam a gravidade da cobertura presidencial se tornar uma atividade de risco a ponto de diversos veículos cancelarem o plantão em Brasília. A sociedade civil, a comunidade internacional e os demais poderes públicos devem somar esforços para interromper a escalada de ataques a comunicadores, incluindo pelo próprio Presidente da República, no Brasil

Organizações de defesa da liberdade de expressão e imprensa alertam sobre a gravidade do momento vivido no Brasil diante da escalada de ataques a comunicadores, estimulada e realizada pelo próprio Presidente da República Jair Bolsonaro. Nesta terça-feira (26/05), ao menos três grupos de comunicação — Globo, Folha e Metrópoles — anunciaram que seus jornalistas não farão mais plantão para acompanhar a agenda presidencial, em Brasília, pelo alto risco a que estão submetidos, fato grave e único na história do período democrático brasileiro.

Em notas (veja ao final), os veículos informaram que um grupo de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro tem sido levado para ficar ao lado de jornalistas de plantão na saída do Palácio da Alvorada, separados apenas com uma grade, e  insultado de forma cada vez mais agressiva os profissionais que estão trabalhando sem que haja providências por parte das autoridades para protegê-los.

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal (SJPDF) tem recebido dezenas de denúncias sobre o grau de insegurança e ameaça ao trabalho dos profissionais de imprensa, que são agredidos, reiteradamente, por apoiadores do presidente com ações que vão de xingamentos, intimidações a tentativas de expor publicamente os jornalistas.

O próprio presidente e integrantes do seu governo têm sido motores dessa escalada. Tanto por ação direta, quando realizam insultos, ataques verbais, virtuais e ameaças institucionais aos veículos e profissionais, quanto por deixarem de cumprir com os deveres dos cargos que ocupam ao se omitir ou minimizar violências praticadas em seu nome.

É emblemático que um mês que começou com a agressão física de profissionais do jornal “O Estado de S. Paulo” em pleno Dia Mundial da Liberdade de Imprensa (03/05) registre o rompimento de mais uma grave barreira de violação à liberdade de imprensa e expressão.

No dia 03 de maio, ao menos dois jornalistas, um fotógrafo e um motorista, sofreram agressões com chutes, socos e insultos por parte de um grupo que manifestava apoio ao presidente da república Jair Bolsonaro, também presente no evento, em Brasília. Bolsonaro minimizou a violência e jamais repreendeu seus apoiadores pelo comportamento. Pelo contrário, dois dias depois, o próprio Presidente foi o autor de insultos: ao desqualificar o jornal Folha de S. Paulo, mandou os jornalistas calarem a boca. Ao qualificar o jornal como ‘canalha’, ‘patife’ e ‘mentiroso’, Bolsonaro exibia uma reprodução da manchete do jornal que faz referência a troca de dois cargos considerados chave na polícia federal em inquéritos em andamento, a do diretor-geral e superintende do Rio de Janeiro.

No último dia 17, uma apoiadora de Bolsonaro, a servidora Angela Telma Alves Berger, agrediu com uma bandeirada a jornalista Clarissa Oliveira, da Band, durante nova manifestação de apoio ao presidente em frente ao Palácio do Planalto. Clarissa fazia a cobertura do ato e teve o óculos quebrado.

O presidente Bolsonaro também já estimulou que o grupo de apoiadores atacassem os jornalistas na porta do Palácio em outra ocasião, quando os profissionais chegaram a abandonar a cobertura do presidente no dia 31 de março.

A sociedade civil brasileira vem  somando notas de repúdio e ações conjuntas para tentar frear a escalada, exigir a responsabilização dos autores dos ataques e cobrar que representantes públicos ajam de acordo com os deveres do cargo que ocupam. O problema também preocupa a comunidade nacional e internacional e já foi alvo de manifestações Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) no Brasil e pela Organização das Nações Unidas (ONU) e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).

A capacidade de jornalistas acompanharem em segurança o poder público para circular informações e opiniões para a sociedade está comprometida. A transparência do governo diminui a cada dia. A desinformação é impulsionada pelo poder executivo. A população vê sua capacidade de fiscalizar as ações do governo federal ser cada vez mais restringida. A liberdade de expressão e a de imprensa enfrentam sua maior ameaça em décadas justamente no momento em que o acesso a informações é central para responder a uma pandemia global.

Práticas como o discurso de ódio, ameaças autoritárias e antidemocráticas, ataques e agressões contra comunicadores extrapolam o direito à liberdade de expressão e à livre manifestação. Pelo contrário, a violência contra comunicadores e a restrição da liberdade de imprensa foram e são os principais elementos mobilizados para restringir a liberdade de expressão e a própria democracia no mundo todo.  Sua restrição impacta não só nos profissionais que desempenham a atividade, como na circulação livre de informações e idéias, restringindo o direito da população à informação como um todo. Questionar a imprensa ou discordar dela são atitudes legítimas, tentar silenciá-la com ataques e agressões é uma evidente e grave violação à Constituição e ao Estado de Direito.

A sociedade civil, comunidade internacional e os demais poderes públicos devem somar esforços para interromper a escalada de ataques a comunicadores e de violações à liberdade de expressão, defendendo práticas democráticas. As organizações que assinam esta nota reafirmam seu compromisso na defesa de direitos fundamentais e da democracia: vamos acionar todas as vias legais e esforços para cobrar representantes públicos e responder aos desafios que atravessamos.

Assinam:

ARTIGO 19
Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé
Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação
Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
Instituto Vladimir Herzog
Jornalistas contra o Assédio
Repórteres sem Fronteiras (RSF)

Notas das empresas de comunicação na íntegra:

Folha de S. Paulo: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/05/folha-suspende-temporariamente-cobertura-no-alvorada-por-falta-de-seguranca.shtml?utm_source=twitter&utm_medium=social&utm_campaign=twfolha

Grupo Globo: https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/05/25/falta-de-seguranca-faz-jornalistas-do-grupo-globo-deixarem-plantao-no-alvorada.ghtml

Metrópoles: https://www.metropoles.com/brasil/metropoles-suspende-cobertura-no-alvorada-por-falta-de-seguranca

Nota do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal: https://www.sjpdf.org.br/noticias-teste/52-em-destaque/4124-nota-de-repudio-a-novos-ataques-de-apoiadores-de-bolsonaro-contra-jornalistas

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