Medida provisória cria autoridade nacional e resgata pontos importantes da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais que haviam sido vetados pela Presidência da República, incluindo a proteção dos dados pessoais do requerente de informações públicas
O Senado Federal aprovou nesta quarta-feira, 29/05, a medida provisória 869/ 2018, que institui a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), órgão que deve ser criado vinculado à Presidência da República, mas se tornar uma autarquia do governo federal em até dois anos. Com a aprovação no Congresso, o texto segue para a sanção presidencial.
Com parecer positivo do relator, o deputado Orlando Silva (PCdoB), o texto final da MP passou por alterações em relação às propostas da sociedade civil, mas resgata pontos importantes da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) que haviam sido vetados pelo Executivo em 2018, além de incluir emendas parlamentares. Entre eles está a proteção dos dados pessoais do requerente de informações públicas.
Importância da proteção da identidade do requerente
A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº 13.709/2018) é a legislação brasileira que determina como os dados pessoais dos cidadãos podem ser coletados e tratados, e que prevê responsabilidades para empresas e para o poder público, buscando evitar o uso indevido das informações.
A Lei foi sancionada em julho de 2018, mas sofreu vetos da presidência em pontos fundamentais. Um deles foi o artigo 23, que determinava que os dados hoje obrigatórios para realizar uma requisição via Lei de Acesso à Informação (LAI) – como nome, documento e contato para retorno – seriam guardados de maneira segura e não seriam repassados às instâncias para as quais aquele pedido é direcionado, garantindo que, ao responder, o servidor público não soubesse quem fez o pedido.
Essa proteção é fundamental para evitar obstáculos relacionados à identificação do requerente de informações ou mesmo que haja intimidações, como as sistematizadas no relatório Identidade Revelada: Entraves na Busca por Informação Pública no Brasil. Lançada pela ARTIGO 19 no ano passado, a publicação reúne 14 casos em que, por não existir a proteção legal dos dados pessoais dos requerentes, as pessoas foram perseguidas, intimidadas, constrangidas ou enfrentaram dificuldades injustificáveis para obter uma informação pública.
Ou seja, sem essa proteção, casos como os compilados no relatório podem se repetir, diminuindo o acesso e a circulação de informações públicas, impactando, portanto, no direito à informação de toda sociedade.
Outros pontos relevantes
Além da criação de um órgão regulatório independente e da proteção ao requerente, com menção à LAI, outras recomendações* foram contempladas no texto final da Lei. Entre elas, está a especificação de que o término do tratamento dos dados pessoais ocorrerá caso haja “comunicação do titular”, “resguardado o interesse público”, no artigo 15, III. A ênfase no interesse público garante a proteção de dados potencialmente importante para investigações contra um suposto “direito ao esquecimento”, cuja aplicação colocaria em risco estudos de informações potencialmente relevantes para o público e para a garantia de transparência.
Também foi contemplada a qualificação das pesquisas que podem utilizar dados pessoais. A emenda define órgão de pesquisa como “entidade da administração pública direta ou indireta ou pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos” com sede no Brasil que tem “em sua missão institucional ou em seu objetivo social ou estatutário a pesquisa básica ou aplicada de caráter histórico, científico, tecnológico ou estatístico”. Assim, a lei cria parâmetros para impedir que qualquer entidade, sob a alegação de estar fazendo pesquisa, colete e trate dados pessoais indiscriminadamente.
A ARTIGO 19 vem participando, ao longo dos anos, dos diversos debates legislativos e mobilizações para garantir um marco positivo para a proteção dos dados pessoais e para o acesso à informação, e se soma, assim, às organizações da sociedade civil que consideram a aprovação da MP 869/2018 um avanço. Vale destacar a importância das articulações da Coalizão Direitos na Rede, que reúne entidades que têm atuação conjunta pela garantia de direitos digitais e por melhores práticas na área.
Entretanto, alertamos que o acompanhamento desta agenda segue necessário, cobrando a responsabilidade do poder público, da iniciativa privada e da sociedade em efetivar a proteção de dados no país. Nesse sentido, é importante que o poder executivo sancione a medida provisória e que os diversos setores interessados se envolvam na construção da ANDP e na preparação para a entrada em vigor da nova legislação.
* Saiba mais: sobre recomendações acesse a publicação Proteção de dados no Brasil, que analisava os projetos em tramitação em 2016