São muitos os ataques e obstáculos enfrentados por comunidades quilombolas no Maranhão na luta pelo seu direito à terra e garantia de seu modo de vida. Em 2017, o Estado Brasileiro autorizou a duplicação da BR-135 nas cidades de Bacabeira, Santa Rita, Itapecuru-Mirim e Miranda do Norte, todas no interior do Maranhão, sem realizar o processo de consulta prévia aos povos quilombolas da região, que, por sua vez, foram surpreendidos pelo início das obras feitas pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT)
Esse processo de consulta prévia é exigido pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é um dos países signatários. Em seu artigo 6º, a convenção determina que os governos deverão “consultar os povos interessados, mediante procedimentos apropriados e, particularmente, através de suas instituições representativas, cada vez que sejam previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente”.
Além disso, a Convenção 169 da OIT também define que povos afetados tenham direito à participação, “pelo menos na mesma medida que outros setores da população e em todos os níveis, na adoção de decisões em instituições efetivas ou organismos administrativos e de outra natureza responsáveis pelas políticas e programas que lhes sejam concernentes”.
Os direitos à consulta prévia e à participação dos povos tradicionais também dizem respeito à necessidade dos governos reconhecerem os direitos de propriedade e posse sobre as terras que tradicionalmente ocupam, outra questão prevista na Convenção 169 da OIT
A ARTIGO 19 está apoiando a luta das comunidades quilombolas afetadas pela duplicação da BR-135 para que tenham seu direito de consulta contemplado, exigindo do Poder Público que forneça informações detalhadas e acessíveis sobre o que será feito, quanto tempo em média as obras durarão e como elas impactarão na vida das famílias que ali vivem.
Atualmente, já existe uma articulação sólida sendo protagonizada por essas comunidades, que, em 2017, chegaram a paralisar as obras da BR-135 por meio da ação direta coletiva. Depois, com o uso da Lei de Acesso à Informação, conseguiram obter documentos públicos que comprovavam as ilegalidades cometidas pela DNIT, documentos esses que foram usados em denúncias protocoladas junto à Defensoria Pública da União e ao Ministério Público Federal (MPF).
Um dos resultados da mobilização foi a realização de uma audiência pública em Santa Rosa dos Pretos, quando os quilombolas da região puderam fazer denúncias diretamente à Defensora Pública da União, representada pela defensora Carolina Balbinott.
É importante lembrar que no último dia 16 de maio, o MPF expediu uma recomendação ao DNIT e à Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEMA) para que os órgãos não seguissem com as obras de duplicação da BR-135 no trecho que passa pelas comunidades quilombolas de Santa Rita e Itapecuru-Mirim. As obras neste trecho, porém, já estavam suspensas desde 22 de fevereiro pela própria SEMA após esta receber denúncias feitas pelas comunidades quilombolas.
Entretanto, mesmo com a proibição, empresas contratadas pelo DNIT continuam trabalhando no local onde vivem as comunidades, conforme relatos de moradores da comunidade, entre eles de uma moradora da comunidade Colombo, no Território Quilombola Santa Maria dos Pinheiros, em Itapecuru-Mirim, que flagrou a operação de uma escavadeira na semana passada.
Para a ARTIGO 19, todos os órgãos públicos responsáveis pelas obras de duplicação da BR-135 devem paralisar as obras e conceder às comunidades quilombolas o direito à consulta, cumprindo, dessa forma, a Convenção 169 da OIT, e respeitando os direitos dos povos tradicionais do Brasil.
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