“Notícias falsas” é tema de declaração assinada por relatores para a Liberdade de Expressão

No último dia 3, em Viena, na Áustria, os relatores especiais para a Liberdade de Expressão da ONU, OEA (Organização dos Estados Americanos), OSCE (Organização pela Segurança e Cooperação na Europa) e CADHP (Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos) publicaram conjuntamente um documento intitulado “Declaração sobre a Liberdade de Expressão e Notícias Falsas, Desinformação e Propaganda”, em iniciativa facilitada pela ARTIGO 19 e pela organização Centre for Law and Democracy.

A declaração é lançada em um momento no qual o fenômeno das notícias falsas tem suscitado novos debates no mundo inteiro sobre a política, o jornalismo, as mídias sociais e o exercício da liberdade de expressão e informação.

Nesse contexto, alguns Estados têm adotado medidas temerárias que, a pretexto de combater a proliferação de notícias falsas, têm restringido a emissão de críticas legítimas e silenciado vozes dissidentes, gerando preocupação na comunidade internacional.

Diante desse cenário, a declaração assinada pelos relatores para a Liberdade de Expressão fornece um conjunto de recomendações sobre como Estados, empresas de tecnologia e meios de comunicação devem responder aos desafios apresentados pela crescente influência que as notícias falsas têm exercido no âmbito digital.

Para o diretor-executivo-global da ARTIGO 19, Thomas Hughes, a declaração é oportuna e bem-vinda.  “A ARTIGO 19 saúda as recomendações oferecidas pelos quatro relatores na abordagem à questão das notícias falsas, desinformação e propaganda, por, sobretudo, observarem as normas internacionais sobre liberdade de expressão. Mais do que nunca, é crucial que se mantenha um ambiente favorável ao exercício desse direito, o que inclui a promoção, a proteção e o apoio à diversidade na mídia e nas fontes de informação, e à ‘alfabetização digital’”, afirma.

“Não há como negar que a desinformação existe em níveis altíssimos, especialmente nas mídias sociais, e que esta pode causar sérios danos à sociedade. No entanto, para nós, as proibições das ‘notícias falsas’ não são a maneira adequada para lidar com seus efeitos. As leis existentes sobre difamação, as disposições legais que protegem o direito à privacidade e as leis sobre a ordem pública já fornecem uma proteção nessa seara”, acrescenta.

A cooperação entre atores não-estatais também é destacada pelo diretor da ARTIGO 19. “É importante notar que a declaração também reconhece a necessidade de cooperação de todas as partes interessadas (“stakeholders”), como os meios de comunicação, jornalistas, sociedade civil, universidades e empresas digitais, na construção de uma melhor compreensão de como garantir o pluralismo dos meios de comunicação e a diversidade num ambiente de mídia convergente. Esperamos que isso inspire as partes interessadas a aumentar a conscientização sobre essas questões e cooperar na busca de soluções”, opina Hughes.

Recomendações

Veja abaixo algumas das recomendações destinadas a Estados, empresas de tecnologia e meios de comunicação que constam na declaração assinada pelos quatro relatores para a Liberdade de Expressão:

  • -Qualquer proibição de se difundir informações baseadas em ideias vagas e ambíguas, incluindo a proibição de se difundir  “notícias falsas” ou “informações não objetivas”, são incompatíveis com as normas internacionais em matéria de restrições à liberdade de expressão;
  • Atores estatais não devem fazer, apoiar, encorajar ou difundir declarações que sabem ou que deveriam saber serem falsas (“desinformação”) ou que demonstrem que não são baseadas em evidências verificáveis (“propaganda”);
  • Os Estados têm a obrigação de promover um ambiente de comunicação livre, independente e diverso, o que inclui a promoção da diversidade nos meios de comunicação – que por sua vez é um elemento-chave para lidar com a desinformação e a propaganda – e também a existência de meios de comunicação pública fortes, independentes e dotados de recursos adequados;
  • Os agentes intermediários da internet devem adotar políticas claras e pré-determinadas de regulação do conteúdo em suas plataformas, incluindo aquelas relacionadas à desinformação e à propaganda. Estas políticas devem basear-se em critérios objetivamente justificáveis, facilmente acessíveis e compreensíveis, e serem adotadas após consulta dos seus utilizadores. Qualquer restrição a conteúdo praticado por agentes intermediários deve respeitar as garantias mínimas do devido processo;
  • -Os meios de comunicação social e os jornalistas devem, se for o caso, apoiar sistemas eficazes de autorregulação – quer em nível de setores específicos dos meios de comunicação, como os órgãos de queixa da imprensa, quer em nível de veículos de imprensa particulares, como ombudsman ou editores públicos – que busquem estabelecer padrões sobre a precisão na difusão de notícias;
  • Todas as partes interessadas – incluindo os intermediários, os meios de comunicação, a sociedade civil e o mundo acadêmico – devem ser apoiados no desenvolvimento de iniciativas participativas e transparentes para uma melhor compreensão do impacto da desinformação e da propaganda na democracia, na liberdade de expressão, no jornalismo e no espaço cívico, assim como na elaboração de respostas adequadas a esses fenômenos.

 

Foto: Yukiko Matsuoka | CC BY 2.0

 

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