Secundaristas denunciam Estado brasileiro em Comissão Interamericana

BRASIL DE FATO 24/03/2016 – Por Rute Pina.

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Violência policial em protestos é tema de audiência em Washington; estudantes fazem “vaquinha” para viabilizar participação.

Crédito: Mídia Ninja

Os estudantes secundaristas que ocuparam  escolas contra a reorganização escolar em São Paulo, no final do ano passado, denunciarão o Estado brasileiro à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) pela violência policial durante os protestos.

A audiência está marcada para o dia 7 de abril em Washington, capital estadunidense. Para financiar a ida, os jovens lançaram uma campanha para arrecadar fundos, disponível até domingo no site Catarse. O dinheiro viabilizará as passagens aéreas, alimentação e hospedagem de três secundaristas e uma advogada.

O pedido foi protocolado pelo Comitê de Mães e Pais em Luta em conjunto com a ONG internacional Artigo 19 e acatado pela CIDH – órgão autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA) que tem a finalidade de proteger os direitos humanos no continente.

Camila Marques, coordenadora do Centro de Referência Legal da Artigo 19, aponta que a importância da audiência é demostrar que o Estado brasileiro está descumprindo uma série de compromissos e acordos internacionais ao cometer violações contra manifestantes.  O Brasil aderiu à Convenção Interamericana de Direitos Humanos – Pacto de San José de Costa Rica –  em 1992.

“A gente busca também evidenciar para a Comissão Interamericana  que essas práticas têm sido realizadas de forma sistemática; que ao invés de tentar se adequar aos organismos internacionais e efetivar o direito à liberdade de expressão, o Brasil vem aprimorando suas técnicas e seu aparato opressor”, afirma a advogada.

Entre as denúncias, contidas em um dossiê com provas da violência dos policiais, estão agressões físicas e psicológicas feitas por agentes, uso desproporcional de armamento menos-letal, detenções arbitrárias contra os secundaristas que se manifestavam e perseguição, vigilância e constrangimento por meio de câmeras da polícia nas escolas e protestos.

O estudante Francisco Braga, de 17 anos,  acredita que a audiência será uma forma importante de divulgar as violações que ainda ocorrem. No dia 11 de março, policiais militares entraram na Escola Estadual Marilena P. Chaparro, na Zona Oeste de São Paulo, e agrediram os alunos após uma manifestação em frente a sala da diretora. A diretora da escola foi afastada pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo.

“É uma forma de divulgar internacionalmente o que aconteceu e ainda está acontecendo e pressionar o governo para respeitar os direitos humanos”, disse Francisco.

“Tem muito estudante que ainda está sendo perseguido pela polícia, que estão sendo processados… É muito importante isso [a audiência] barrar as ações da polícia, que faz o que quer e, por qualquer coisa, invade escola. Tem muitos estudantes que serão julgados por desacato. A perseguição continua muito forte – algo que a Justiça permite e não deveria”, denuncia o estudante.

Francisco foi um dos estudantes detido arbitrariamente em um dos travamentos que os secudaristas realizavam durante as ocupações. Ele conta que, quando intimado, terá que responder por desacato a autoridades e furto de cadeiras  – os alunos as levavam para os bloquear as vias e depois devolviam os objetos à escola.

A CIDH, no entanto, não possui instância ou poder de responsabilização do Estado brasileiro pelas violências cometidas. Mas Camila Marques acredita que a audiência, além de ser um mecanismo de pressão para as instâncias nacionais, pode abrir caminhos para a construção de um quadro normativo internacional mais consolidado sobre os direitos de protestos quanto também para que no futuro a gente obtenha a responsabilização do Estado.

Nos 20 minutos dados a cada parte, devem se apresentar tanto a sociedade civil quanto representações do Estado brasileiro – ainda não se sabe se por meio do Ministério da Justiça ou órgãos da diplomacia.

Esta é a terceira audiência que a ONG Artigo 19, juntamente com outras organizações, realiza desde junho de 2013, com o objetivo de  demostrar que o Estado brasileiro vem reiteradamente descumprindo a convenção. “A gente almeja que a Comissão possa cobrar o Estado brasileiro a uma mudanca de prática”, conclui a advogada.

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