A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) esteve no estado do Amazonas, entre os dias 4 e 8 de agosto, para realizar escutas nas cidades de Manaus e Atalaia do Norte com autoridades públicas, defensores de direitos humanos, lideranças indígenas e comunicadores da região, no âmbito das atividades previstas no Plano de Ação da Medida Cautelar nº 449-22 (MC-449-22) na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).
Esta medida foi concedida para proteger aqueles que atuam na região, em razão dos riscos e ameaças intensificados após os assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, no Vale do Javari, em junho de 2022.
A visita foi coordenada pelo Conselho Deliberativo do Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (CONDEL/PPDDH). Integraram a comitiva conselheiros do PPDDH e representantes da sociedade civil da ABRAJI, da ARTIGO 19, do Instituto Dom Philips, da Repórteres Sem Fronteiras (RSF) e da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), bem como representantes do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), incluindo o coordenador do Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) e representantes do Ministério das Relações Exteriores (MRE), do Ministério da Justiça e da Segurança Pública (MJSP), da Secretaria Geral da Presidência da República (SG/PR) e da Secretaria de Comunicação Social (Secom/PR), além de membros do Ministério Público Federal (MPF).
A Mesa de Trabalho, espaço formal de articulação entre o Estado, as organizações peticionárias e os beneficiários, tem como objetivo implementar o Plano de Ação aprovado e lançado em dezembro de 2023. No âmbito dessa instância, participam os órgãos responsáveis pela implementação das medidas cautelares concedidas em favor de Dom Phillips e Bruno Pereira, estendidas aos membros da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (UNIVAJA). A presença de Beatriz Matos e Alessandra Sampaio, viúvas de Bruno e Dom, conferiu à missão uma dimensão simbólica e humana fundamental para reforçar a relevância desse trabalho conjunto.
A Mesa é estruturada a partir de quatro núcleos de atuação — integridade e memória, segurança territorial, política de proteção a defensores de direitos humanos, ambientalistas e comunicadores, e acompanhamento das investigações — que orientam a formulação de políticas não repetição voltadas à garantia da vida e da integridade pessoal dos beneficiários e à prevenção de novas violações.
Durante a visita à Atalaia do Norte, o CONDEL/PPDDH, realizou uma escuta qualificada dos beneficiários da MC-449-22 com o objetivo de assegurar a continuidade da implementação das medidas de proteção, alinhando as necessidades específicas de cada pessoa e do território.
Na ocasião, ocorreu uma reunião da Mesa de Trabalho Conjunta, presidida pela secretária executiva da CIDH, Tania Reneaum Pansz, que teve como objetivo avaliar a implementação das medidas previstas no Plano de Ação, reforçar o compromisso das partes com a missão da Mesa e repactuar responsabilidades. Raquel da Cruz Lima, coordenadora do Centro de Referência Legal da ARTIGO 19 Brasil e América do Sul e uma das articuladoras da Mesa de Trabalho Conjunta, ressalta que “um dos principais pontos da missão foi averiguar a implementação dos planos de proteção individual dos beneficiários, uma demanda antiga do grupo”.
No entanto, apesar de reconhecidos alguns avanços na implementação de parte das ações, foi destacado que ainda restam diversos objetivos e eixos centrais do plano de ação que não foram alcançados, como a atualização do plano de proteção da Terra Indígena Vale do Javari, de forma a englobar a garantia da atuação segura de comunicadores e as demandas das diversas etnias que vivem no território, a institucionalização de medidas de segurança para os beneficiários do PPDDH, a transparência sobre o andamento das investigações sobre os crimes contra Dom, Bruno e sobre as ameaças contra as lideranças do território, e o pedido de desculpas formal pelas mais altas autoridades do Estado.
“Os trabalhos no Javari foram bem proveitosos para alinhar as expectativas do lado dos beneficiários perante a CIDH. No entanto, não vimos por parte do governo um compromisso mais concreto em manter os termos da cautelar, já concedida. Isto gera preocupação e desperta uma violação de não cumprimento das cautelares, o que pode ser levado para a Corte Interamericana, prejudicando muito o governo no cenário político internacional, sobretudo em matéria de direitos humanos fundamentais.”, diz Eliésio Marubo, procurador jurídico da UNIVAJA .
Artur Romeu, diretor executivo da RSF, ressalta que “A falta de compromisso e coordenação do alto escalão do governo brasileiro colocam em risco a segurança de jornalistas que atuam em áreas de conflito ambiental, como a região onde Dom Phillips e Bruno Pereira foram assassinados”. E completa, “a proteção da imprensa deve ser prioridade, com ações ancoradas na realidade local.”
Entre os compromissos firmados, destacou-se a realização de uma audiência pública no primeiro período de sessões da CIDH de 2026, como forma de dar visibilidade aos avanços, desafios e necessidades identificadas no acompanhamento das medidas cautelares.
O último dia de atividades foi marcado por uma reunião de escuta com comunicadores da região, que compartilharam as condições em que exercem o jornalismo e outras formas de comunicação sobre o que ocorre na Amazônia, bem como as dificuldades e riscos associados à atuação a partir do território.
Entre as atividades realizadas, destacou-se a tomada de subsídios organizada pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom/PR), pelas organizações peticionárias — incluindo a Repórteres Sem Fronteiras (RSF), a ARTIGO 19, Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) — e pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), com o objetivo de identificar os principais desafios enfrentados pelos comunicadores na Amazônia em relação à proteção e à sustentabilidade de seu trabalho. A tomada de subsídios sobre a sustentabilidade do jornalismo ambiental e na Amazônia está aberta para coleta de insumos até o dia 7 de setembro em: https://www.gov.br/participamaisbrasil/tomada-de-subsidios-sobre-sustentabilidade-do-jornalismo-ambiental-e-sobre-a-amazonia
As organizações que acompanham o caso na CIDH são: ARTIGO 19 Brasil e América do Sul, Instituto Vladimir Herzog, Repórteres Sem Fronteiras (RSF), Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Instituto TORNAVOZ, Instituto Dom Philips, Washington Brazil Office (WBO), União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) e Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (Opi).