A ARTIGO 19 Brasil e América do Sul repudia as recentes ações repressoras do governo do Pará em resposta a mobilização social que tem como pauta a revogação da Lei nº 10.820/2024, que altera o Sistema Modular de Ensino (Some), responsável por levar educação presencial aos territórios indígenas.
Desde 14 de janeiro de 2025, a Secretaria de Estado de Educação (Seduc) está ocupada pelos movimentos indígenas, com cerca de 300 pessoas indígenas de pelo menos 20 etnias ocupam dentro do prédio da Secretaria. Desde então, a violência contra comunicadores e manifestantes tem sido uma constante, com o objetivo claro de silenciar as críticas.
Desde o início da ocupação, o governo também adotou medidas repressivas, como o corte de energia do prédio e o uso de spray de pimenta nos banheiros da instituição. A ARTIGO 19, junto a outras organizações, condena o uso de “armas menos letais”, considerando-as inadequadas e capazes de causar danos irreparáveis à vida e à integridade física. As ações da Polícia Militar também proibiram jornalistas de cobrir a ocupação.
Segundo o Sindicado de Jornalistas do Pará (SINJOR-PA), a cobertura da imprensa foi uma reivindicação do próprio movimento indígena, que acionou as equipes de reportagem, a fim de resguardá-lo e mostrar que o patrimônio da Seduc está sendo preservado.
Mais recentemente, houve repressão à ocupação da BR-163, a partir da qual o movimento indígena também pressiona pela revogação da Lei. Na terça-feira (28), a Justiça Federal determinou a desocupação da rodovia, autorizando o uso da força policial para tanto. A partir desse momento, a Polícia Militar passou a agir contra os manifestantes, inclusive a partir da construção de listas que informariam quem seriam as lideranças presentes na ocupação, numa evidente ameaça de criminalização.
Lideranças argumentam que o Some é essencial para a preservação das culturas e línguas indígenas e que a sua alteração prejudica ainda mais as comunidades que já enfrentam uma série de barreiras históricas para acessar os sistemas convencionais de ensino.
A nova proposta do governo estadual de substituir o Some por ensino a distância mediado por televisores desconsidera as realidades locais, especialmente no que diz respeito a infraestrutura básica nos territórios, seja por ausência de eletricidade, internet ou equipamentos adequados.
É alarmante que, em um ano marcado pela COP-30, maior Conferência da ONU sobre mudanças climáticas, sediada em Belém, as autoridades públicas e de segurança estejam atuando de forma ostensiva contra povos indígenas, pessoas exercendo o direito de protesto e comunicadores, evidenciando um grande despreparo da gestão estadual em garantir a difusão de diferentes vozes e opiniões e na proteção de comunicadores e defensores de direitos humanos e socioambientais.
A ARTIGO 19 Brasil e América do Sul insta as autoridades públicas a atuarem imediatamente para garantir o direito de protesto e de participação social das comunidades indígenas e de defensores de direitos humanos e ambientais, bem como a proteção de comunicadores, assegurando um diálogo efetivo e respeitoso que considere as demandas legítimas das comunidades na construção de uma política de educação indígena no Estado. O mesmo se espera para o grande evento internacional que se aproxima.