Análise comparativa classifica país como “aberto”, o mais elevado nível do ranking global
O Brasil teve o maior avanço do mundo no ranking do Relatório Global de Liberdade de Expressão, publicado todos os anos pela ARTIGO 19 e que teve a sua mais recente edição lançada na última terça-feira (21). O país ficou com 81 pontos, dando um salto da 87ª posição para a 35ª.
O relatório é o resultado da análise de 25 indicadores, que perpassam os temas das leis e sua aplicação, direitos digitais, liberdade de mídia, participação política, participação cívica e liberdade política e privada. O levantamento é feito a partir da base de dados V-DEM e conta com a colaboração de mais de quatro mil especialistas de diversas regiões do planeta.
Ao final do processo de avaliação, a ONG classifica os países em uma escala que vai de zero a 100 que, por sua vez, estão distribuídos nas categorias aberto, menos restrito, restrito, altamente restrito ou em crise.
O Brasil obteve uma melhora substancial em 17 indicadores e chegou à categoria “aberto”. O avanço é consequência da melhora do país em temas como a participação de organizações da sociedade civil, liberdade de publicação de conteúdo político, monitoramento governamental da internet, transparência de leis e sua aplicação, violência política e liberdade religiosa e acadêmica. No ranking lançado neste ano pela ARTIGO 19, foram avaliados 161 países.
O último relatório, publicado em 2023 com dados de 2022, o Brasil apresentou o pior resultado da série histórica, quando chegou à categoria “restrito”. Apesar da boa notícia, há um longo caminho a percorrer na consolidação da garantia do direito à liberdade de expressão.
Acesse o relatório aqui.
Brasil ainda enfrenta desafios
Apesar da melhora geral, o Brasil ainda enfrenta desafios no campo dos direitos humanos e da liberdade de expressão. O país não realizou as reformas e regulações para mudar o cenário de concentração midiática, em que poucas empresas detêm o controle dos meios de comunicação e da informação. Ao mesmo tempo, não houve avanços significativos em políticas de fortalecimento da comunicação popular, comunitária e independente.
Outro problema observado é a violência contra defensores de direitos humanos, comunicadores e ambientalistas. Os programas de proteção a ativistas e pessoas ameaçadas carecem de recursos e desenvolvimento.
Há, ainda, um alarmante número de ataques direcionados a mulheres, comunidade LGBTQIAP+, povos indígenas e populações periféricas, que têm dificuldade de se expressarem e defenderem os seus direitos. No universo da política não é diferente, com o aumento da violência política de gênero.
A ausência de programas e políticas do executivo e a imobilidade do Legislativo em criar leis sobre o tema, forçam o Judiciário a atuar em questões relativas à liberdade de expressão.
Somada à ausência de balizas claras em relação ao exercício do direito à liberdade de expressão por parte de tribunais superiores, a atuação do Judiciário tem sido questionável e sem linha definida. Isso fragiliza o poder e gera insegurança quanto ao exercício do direito.
No campo das tecnologias digitais, o Brasil tem dificuldade de debater e implementar uma regulação dos mercados digitais, principalmente as mídias sociais, e continua a sofrer com a ausência de responsabilização de agentes políticos e econômicos. Além disso, o país sofre com a falta de uma agenda positiva no campo, sem políticas que unem tecnologia, cultura e comunicação de maneira efetiva e estratégica.
Situação no mundo
Mais da metade da população global está vivendo em países em que a liberdade de expressão está em crise. Isso significa que cerca de 4 bilhões de pessoas não têm o direito de se expressar livremente sem que sofram sérias consequências.
Em 2023, o percentual de países com os piores indicadores de liberdade de expressão era de 34%. Para Quinn McKew, Diretora Executiva da ARTIGO 19 a nível global, o relatório deste ano é preocupante e faz, em suas palavras, “soar um alarme muito alto”, uma vez que o número de pessoas sem o direito de se expressar, acessar informação e participar de eleições livres e abertas é o maior dos últimos 20 anos.
Essa regressão foi impulsionada pela Índia, que registrou uma queda de 35 pontos nos últimos dez anos, ou seja, desde que Narenda Modi se tornou o primeiro-ministro do país.
Atualmente, o país vive uma realidade de perseguição aos meios de comunicação independentes, ataques a opositores e minorias religiosas, entre outras ações de cunho autoritário. MacKey lembra que “o declínio da Índia aconteceu diante de todos, mas essa é uma história sobre a qual muitos não querem falar. Os dados são claros: os primeiros sinais de enfraquecimento da democracia são os ataques à liberdade expressão.”
A Diretora explica que as violações às liberdades têm feito parte do cotidiano de pessoas em todo o mundo. MacKey ainda lembra que a maior incidência de ações autoritárias por parte de governos, atualmente, tendem a acontecer, em muitos países, por meio do ela define como “mudanças sutis nas políticas apresentadas em nome da segurança pública, da moralidade ou da segurança nacional”.