International Freedom of Expression Exchange sinaliza preocupação com as eleições brasileiras e o futuro da democracia

O International Freedom of Expression Exchange (IFEX), que atua na defesa da liberdade de expressão e o direito de acesso à informação em 90 países, divulgou, nesta sexta (30), nota  sobre as eleições brasileiras, em que demonstra preocupação com o futuro da democracia.  ARTIGO 19 e Abraji representam a rede no Brasil.

 

A democracia sobreviverá às eleições no Brasil?
Annie Game*

O que vem pela frente para o Brasil? Não há uma resposta simples para essa pergunta, mas a democracia está em risco enquanto o país se aproxima das eleições gerais marcadas para 2 de outubro de 2022 – e todos deveríamos estar preocupados.

O autoritarismo, antes visto como uma tendência a ser observada, agora pode ser considerado uma espécie invasora. Está em ascensão em diferentes partes do mundo, alimentado, entre outras coisas, pela enganosa e convincente retórica anti-direitos, visibilizada e materializada em campanhas de desinformação, ataques a jornalistas e constante erosão do espaço cívico. E essa espécie continua se espalhando.

Na América Latina, a democracia tem estado em rápida deterioração. Em uma reunião de grupos de liberdade de expressão ocorrida durante o Fórum COLPIN 2021, a sociedade civil – incluindo vários membros da rede IFEX – expressou séria preocupação com essa situação, afirmando que “[a] ascensão do autoritarismo, tanto de direita quanto de esquerda, se acentuou na maioria de nossos países, colocando em xeque os fundamentos da democracia. Constatamos que, durante a pandemia, essas expressões autoritárias foram fonte de manipulação e desinformação, incrementando as práticas de ocultação e dificultando o acesso à informação. Nesse contexto, constatamos a existência de regimes na região em que o Estado [Democrático] de Direito é praticamente inexistente, e onde prevalece uma lógica totalitária que asfixia qualquer expressão cidadã. O jornalismo no exílio se multiplicou na região.”

O autoritarismo não é novo na América Latina. Ele acompanha a história da região e recentemente ressurgiu com força impulsionado por eleitores frustrados com os partidos e a política da ‘velha guarda’, principalmente em países atormentados pela corrupção, insegurança e desigualdade econômica. As ferramentas proporcionadas pela tecnologia multiplicaram o alcance e a influência de um discurso que explora esses medos, oferecendo alternativas superficiais. O resultado são regimes caracterizados por líderes individualistas e populistas, ruptura das normas constitucionais e abusos de poder.

A sociedade civil enfrenta há muito tempo essa ameaça. Talvez por isso a América Latina seja uma das regiões do mundo onde se registra o maior número de assassinatos de jornalistas e defensores de direitos humanos. Somente em janeiro de 2022, 20 defensores de direitos humanos e quatro jornalistas foram mortos na região. E os números hoje são muito maiores.

É em meio a esse contexto regional e global que, no dia 2 de outubro, ocorrerão as eleições no Brasil. As pesquisas acompanham uma campanha feroz que teve a polarização em seu centro. Polarização essa que foi fomentada e ampliada por táticas e técnicas que se baseiam no uso abusivo de tecnologias novas e emergentes, mas que transformam em armas velhas narrativas enraizadas em preconceitos, racismo, misoginia e uma total não aceitação do “outro”. Valores como diversidade e pluralidade têm sido atacados, bem como aqueles que os defendem.

Os sinais são claros – o Brasil tem visto um declínio dramático nas liberdades civis nos últimos anos. Durante a atual campanha, Bolsonaro vem atacando instituições, desacreditando o processo eleitoral e promovendo fortemente o uso das armas. Não há dúvida de que o futuro da democracia no Brasil será decidido no início de outubro.

Como a maior economia da América Latina e a quarta maior democracia do mundo, o Brasil é um termômetro – podemos argumentar que é o futuro da democracia global o que está em jogo neste pleito. Não só da democracia, mas dos direitos humanos e da sustentabilidade ambiental.

 

Então, o que vem pela frente para o Brasil?

Não há uma resposta simples a essa pergunta. Mesmo que Bolsonaro não seja reeleito, os desafios pela frente são gigantescos. Mas, se ele ganhar, o projeto autoritário vence. E o Brasil se tornará outro alfinete no mapa, mais um território onde as raízes do autoritarismo se aprofundam e se arraigam.

O espaço cívico brasileiro precisa ser protegido para garantir que jornalistas, ativistas e defensores dos direitos humanos não se tornem uma espécie em perigo de extinção. Precisamos defender a democracia, promovendo a liberdade de expressão e o fortalecimento da sociedade civil.

Os jornalistas e os grupos da sociedade civil têm um papel fundamental a desempenhar – eles têm exposto e corrigido a desinformação que visa a enganar os eleitores e manipular a votação durante eleições em todas as regiões do mundo.

No Brasil, os membros da rede IFEX – a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo – e a Artigo 19 vêm trabalhando juntos para garantir a segurança dos jornalistas, o direito de protesto, o direito à informação e à participação. Eles solicitaram, por exemplo, o compromisso dos candidatos presidenciais com a liberdade de expressão; têm promovido iniciativas de verificação de fatos; têm trabalhado para incentivar a participação e a informação sobre o processo eleitoral entre os jovens; e estimulam o debate e a discussão sobre questões centrais em nossas lutas democráticas atuais, como a desinformação, os discursos de ódio, a transparência, a violência política e as redes sociais.

O que eles precisam agora é da nossa atenção e apoio. Eles precisam saber que não estão sozinhos e que estamos observando o processo eleitoral e suas consequências no início de outubro. Os membros da rede IFEX em toda a região demonstraram sua solidariedade por meio de uma campanha veiculada em redes sociais que pede pelo Brasil: #DefendaoJornalismo #ProtejaoEspacoCivico. Caso contrário, a cartilha do autoritarismo continuará se espalhando pelo mapa.

Não fique calado. Vamos manter nossos olhos atentos ao Brasil e apoiar o trabalho daqueles que defendem a democracia na linha de frente. Junte-se a nós!

*Annie Game é a diretora executiva do IFEX, uma rede global que promove e defende a liberdade de expressão e a informação como direitos humanos fundamentais. O IFEX é um nexo para a experiência da liberdade de expressão e conta com a contribuição de mais de 120 organizações-membro, abrangendo 90 países e tem o compromisso com a colaboração e a defesa transformadora.

 

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