Governo Bolsonaro e a prática de ofensa e intimidação de jornalistas e comunicadoras

A ARTIGO 19 repudia os ataques do Presidente Bolsonaro à jornalista Vera Magalhães durante o debate entre presidenciáveis organizado e transmitido pela Band TV em 28 de agosto de 2022. Nesta oportunidade, o candidato à reeleição disse que a jornalista “dorme pensando” nele, que ´´teria alguma paixão´ por ele e que ´é uma vergonha para o jornalismo brasileiro´´. Também acusou a jornalista de estar mentindo, e disse que não estaria atacando mulheres – e que quem afirmasse o contrário, estaria se vitimizando.

Não é a primeira vez que o representante do Executivo ataca a jornalista. Nos primeiros um ano e nove meses do mandato, o presidente, seus filhos e seus ministros fizeram ao menos 25 menções à jornalista em suas redes sociais, com tom estigmatizante e intimidador. E, como é de praxe na política do ódio da base bolsonarista contra a imprensa, os ataques que partiram de agentes políticos foram seguidos de ataques em massa nas redes sociais, que culminaram inclusive na exposição de dados pessoais da jornalista e de sua família, violando seu direito à privacidade.

A prática de ofender, insultar e intimidar comunicadores é cotidiana no governo Bolsonaro, e se aprofunda entre as mulheres. Para essas últimas, não raro são mobilizados ataques e ofensas de cunho sexual ou sexualizante, ou que diminuem sua atividade profissional na comunicação ou ainda que fazem menção a questões estéticas e de aparência física. Aliás, cabe lembrar que diversas jornalistas presentes neste debate já haviam sido vítimas das práticas misóginas do presidente contra mulheres comunicadoras: Patrícia Campos Mello, Thaís Oyama e Mônica Bergamo também foram alvo de ataques do presidente, de seus filhos e ministros, e de seus apoiadores.

O Relatório Global de Expressão da ARTIGO 19 aponta que o Brasil é o terceiro país que, entre 2011 e 2021, teve um dos maiores declínios nos 25 indicadores de liberdade de expressão analisados (1). O mesmo documento informa que o país caiu 58 posições no ranking global de liberdade de expressão entre 2015 e 2021. Outras organizações de proteção a comunicadores e ao direito à liberdade de expressão corroboram a narrativa desse cenário: atualmente, o Brasil ocupa a posição 110 no ranking de liberdade de imprensa da organização Repórteres Sem Fronteiras, entre 180 países observados  (2).

O Governo Bolsonaro tem sido apontado como agente especial das violações aos direitos à liberdade de expressão e imprensa e ao acesso à informação: nos primeiros 1 ano e 9 meses desta gestão, o presidente, seus filhos (que também são representantes eleitos em outras esferas) e seus ministros da gestão federal, foram agentes de ao menos 449 violações, praticadas principalmente através das redes sociais (3) . O presidente, bem como outros integrantes de seu grupo político, seguem promovendo ataques a comunicadores – especialmente contra aqueles que produzem conteúdo sobre política e criticam a atual gestão do presidente. Vale destacar aqui alguns casos, tais quais o uso ostensivo da Lei de Segurança Nacional (legislação datada do período da ditadura militar brasileira, que foi recentemente revogada), especialmente contra aqueles que criticaram as ações do presidente durante a pandemia de COVID-19 (4); os momentos em que Bolsonaro ou agentes de sua segurança pessoal agrediram comunicadores fisicamente; situações nas quais apoiadores do presidente agrediram ou intimidaram comunicadores durante pronunciamentos e eventos de interesse público, inviabilizando coberturas; episódios em que o presidente e seus aliados políticos fizeram manifestações de caráter misógino contra mulheres jornalistas e comunicadoras, que se desdobraram em ondas de ataques às mesmas em suas redes sociais; ou mesmo as ocasiões em que foi descredibilizado o trabalho da imprensa durante eventos de importância maior à população, como foi durante a pandemia de COVID-19. Em razão dessa conjuntura, a ARTIGO 19 indica um processo de crescente institucionalização da violência contra comunicadores no Brasil (5).

Nos colocamos à disposição da jornalista Vera Magalhães, bem como de outras comunicadoras que sejam alvejadas por situações similares de perseguição e ataques, que vem se tornando prática corriqueira nas redes sociais e espaços virtuais principalmente após 2018. Repudiamos os ataques feitos pelo presidente e demandamos que o Estado, seus representantes e candidatos nas eleições de 2022 observem os compromissos assumidos pelo Brasil internacionalmente e no texto constitucional, resguardando os direitos à liberdade de expressão, ao acesso à informação e ao Estado Democrático de Direito.

 

(Crédito imagem: Reprodução Instagram @veramagalhaesjornalista)

 

REFERÊNCIAS

1.

2. https://rsf.org/pt-br/ranking-mundial-da-liberdade-de-imprensa-2022-nova-era-da-polariza%C3%A7%C3%A3o

3.

4. Durante o governo Bolsonaro, o número de inquéritos da Polícia Federal com base na Lei de Segurança Nacional cresceram em 285%, sendo que parte deste aumento representa justamente as ações movidas pelo Presidente e por seus aliados políticos contra comunicadores, ativistas, manifestantes e defensores de direitos humanos. Isso porque, originalmente, a legislação dispunha sobre os crimes praticados contra a honra de alguns agentes políticos, tal qual o Presidente da República. Os dados sobre o aumento do uso da legislação podem ser encontrados em: Estadão. Inquéritos da PF com base na Lei de Segurança Nacional crescem 285% no governo Bolsonaro. 19 mar. 2021. Disponível em:
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,inqueritos-da-pf-com-base-na-lei-de-seguranca-nacional-crescem-285-no-governo-bolsonaro,70003652910

5.

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