Publicação do Ministério da Saúde é desinformação e ataca direitos sexuais e reprodutivos assegurados legalmente

Mantendo os sucessivos ataques aos direitos reprodutivos e sexuais das pessoas com capacidade de gestar no Brasil e reforçando uma campanha de desinformação adotada como política de governo, o Ministério da Saúde, por meio da Secretaria de Atenção Primária à Saúde, disponibilizou nesta semana um documento em que afirma não existir aborto legal no Brasil e que “todo aborto é um crime, mas quando comprovadas as situações de excludente de ilicitude após investigação policial, ele deixa de ser punido, como a interrupção da gravidez por risco materno”. A ARTIGO 19 alerta que essa informação está incorreta: de acordo com o artigo 128, do Código Penal e  com a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 54 há casos em que o aborto não é considerado crime, nem precisa de investigação policial, logo é legal e regulamentados pelo poder público e pelo Ministério da Saúde.

O manual intitulado “Atenção Técnica para Prevenção, Avaliação e Conduta nos Casos de Abortamento” substitui a última cartilha com foco em atendimento humanizado ao abortamento e é apresentado como um guia para apoiar profissionais e serviços de saúde, mas demonstra ser mais um instrumento na agenda antiaborto do governo federal, que tem como “editor geral”, o secretário nacional de Atenção Primária, Raphael Câmara, médico ginecologista conhecido pela sua posição extremada e contrária ao direito ao aborto.

A publicação desinforma, produz insegurança jurídica e representa um grande retrocesso na autonomia da pessoa gestante ao buscar ilegalmente impor a notificação à polícia como requisito para que um procedimento legalmente autorizado sem qualquer exigência de registro policial seja realizado. Ressalte-se que  o próprio código penal brasileiro dispensa essa prática desde a criação da norma sobre aborto humanitário.

Em um cenário em que as principais fontes de informação sobre abortamento previsto em lei são ainda, infelizmente, documentos técnicos, as diretrizes deixam pessoas que precisem de acolhimento em uma dupla vulnerabilidade: a de que o profissional de saúde se paute no material inverídico e viole o direito da pessoa gestante, e o de desestimular pessoas em situações emergenciais e buscar o serviço. Outros dois exemplos de materiais desinformativos compartilhados pelo Ministério da saúde são a campanha que estimula abstinência sexual na adolescência “Viva o melhor de cada tempo” e uma notícia que afirma ser obrigatória a comunicação a autoridades policiais em caso de violência sexual – prática sustentada por portaria inconstitucional.

A ARTIGO 19 denuncia que o manual viola a lei e marca a postura do Ministério da Saúde de desinformar, constranger e, em mais um episódio, estimular a criminalização das vítimas de violência sexual que procuram pelo serviço de aborto legal. 

Postado em

Icone de voltar ao topo