O Supremo Tribunal Federal proferiu decisão de extrema importância para a liberdade de imprensa e o direito ao protesto no Brasil no último dia 10 de junho de 2021. Em um contexto de avanço dos autoritarismos, os 11 Ministros do STF decidiram favoravelmente à indenização de Alex Silveira, fotojornalista ferido por um tiro de bala de borracha disparado pela Polícia Militar de São Paulo em 2000, que o deixou cego do olho esquerdo.
Por ampla maioria de votos (10 a 1), o STF decidiu que o Estado deve ser responsabilizado quando jornalistas são feridos por forças de segurança durante a cobertura de manifestações. As considerações e votos dos Ministros também levaram em conta a desproporcionalidade da repressão a protestos por parte da Polícia Militar.
A ARTIGO 19 Brasil e América do Sul acompanha o caso desde 2014 como amicus curiae. Em 18 de maio de 2000, Alex Silveira realizava a cobertura de protesto de professores em São Paulo quando foi atingido pela bala de borracha. A lesão resultou na perda de 85% de sua visão, impactando diretamente o exercício de sua atividade profissional.
Desde então, Alex segue lutando por reparação e responsabilização do Estado de São Paulo. Na primeira instância, a justiça reconheceu que era devida indenização ao fotógrafo. Entretanto, em 2014, o Tribunal de Justiça de São Paulo alterou a decisão, desta vez negando a indenização e sustentando o argumento de que a responsabilidade pela grave lesão pertencia apenas a Alex, uma vez que ele teria por escolha própria “permanecido no local de tumulto”.
Esta decisão do TJ-SP estimula a atuação desproporcional da Polícia Militar, validando suas atitudes violentas, além deinibir e censurar a profissão de jornalistas e comunicadores (as), com graves consequências para a liberdade de expressão. Também reduz o acompanhamento e consequente notícias sobre a violência em manifestações por parte de agentes estatais diante do iminente risco à integridade física de jornalistas.
“O cenário vem piorando muito. Sempre teve agressão, mas agora é institucionalizada e personalizada como nunca tinha visto antes. E não afeta só jornalistas, mas também o direito de protestos e os transeuntes. É absurdo, isso não é democracia, este é o fato”, avalia Silveira, trazendo à tona a repressão desproporcional da Polícia Militar em relação a manifestações populares ocorridas no fim de maio deste ano, em Pernambuco, que deixou cegas (também por balas de borracha) duas pessoas que nem participavam das manifestações.
Legado histórico
A decisão favorável do Supremo Tribunal Federal (realizada entre 09 e 10 de junho de 2021) possui caráter de repercussão geral: logo, fixa entendimento e orienta instâncias inferiores do Judiciário para julgamento de casos futuros que tragam similaridades ou mesmo para casos que já estão em andamento, mas que ainda não transitaram em julgado.
Embora seja um dos casos mais emblemáticos envolvendo comunicadores (as) no Brasil, espera-se que a decisão da justiça sirva como exemplo para outras ocorrências semelhantes de violência que seguem impunes. A vitória também reafirma o importante papel de assegurar os direitos à liberdade de imprensa e ao protesto no país. “É um julgamento histórico e espero que sirva de exemplo para outros casos e seja um legado que eu possa deixar para a profissão” pondera o fotojornalista Alex Silveira.