ONU atualiza recomendações de proteção a jornalistas

Nova resolução inclui temas como segurança durante a pandemia de Covid-19 e proteção para jornalistas mulheres

Na terça-feira (6), o Conselho de Direitos Humanos da ONU atualizou sua resolução com recomendações de proteção a jornalistas. O documento, produzido desde 2012 e atualizado a cada dois anos, agora inclui também recomendações para casos de violência de gênero e ameaças extraterritoriais, além da pandemia de Covid-19.

A nova resolução foi liderada por um grupo de Áustria, Brasil, França, Grécia, Marrocos, Qatar e Tunísia; e já foi apoiada por mais de 70 países de todas as regiões. Adotada por consenso, expressa um forte comprometimento internacional para acabar com todos os ataques, represálias e violências contra jornalistas no mundo. Nesse sentido, a ARTIGO 19 expressa seu apoio à nova resolução.

A cada atualização, a resolução estabelece padrões cada vez mais progressistas. Em 2020, novos temas foram abordados, como ameaças extraterritoriais, leis vagas e processos judiciais estratégicos contra a participação pública. Além disso, foram reforçadas as recomendações para a proteção de jornalistas mulheres, alvo de violências específicas de gênero, e para garantir a segurança de jornalistas e a sustentabilidade de veículos de mídia no contexto da pandemia de Covid-19.

No entanto, embora o crescente apoio internacional à resolução seja positivo, permanecemos alertas com a falta de implementação. A impunidade de crimes contra jornalistas chega a alarmantes 90% a nível global, o que torna urgente a tomada de ação. Insistimos que todos os Estados traduzam o comprometimento em alocação de recursos e em vontade política a nível nacional para prevenir, proteger e reparar todas as violações de direitos humanos cometidas contra jornalistas.

Violência de gênero
A resolução passou a ser mais enfática quanto a especificidades de gênero, demandando medidas de proteção a jornalistas mulheres, incluindo medidas para prevenir assédio sexual ou outras formas de violência de gênero e medidas para fomentar as denúncias de assédio ou violência, com a realização de investigações sensíveis à temática. Ainda, recomenda que líderes políticos e agentes públicos não usem linguagem misógina ou discriminatória contra jornalistas mulheres.

A recomendação vai ao encontro de nossas preocupações com ataques baseados em gênero e em ataques e represálias que afetam desproporcionalmente as mulheres e outros grupos minorizados. Um monitoramento da ARTIGO 19 sobre violência contra jornalistas e veículos de informação no Brasil observou que a mobilização de conteúdos discriminatórios tornou-se uma violação comum no país, associando a incapacidade do/a jornalista de produzir conteúdos coerentes e confiáveis à condições e características associadas à raça, classe, gênero, sexualidade, entre outros. Tais violações não somente institucionalizam a violência contra comunicadores, mas também perpetuam noções racistas, machistas, LGBTQIfóbicas e classistas.

É hora dos Estados tomarem medidas concretas para acabar com a impunidade, investigando e assegurando a reparação das violações de direitos humanos cometidas contra mulheres e outros grupos minorizados. É preciso adotar uma abordagem sensível a gênero no desenho e na implementação de políticas públicas para a proteção de jornalistas.

COVID-19
A resolução foi atualizada para acrescentar também que a pandemia de Covid-19 “teve implicações significativas para o trabalho, saúde e segurança de jornalistas”, convocando os Estados para avaliar os danos que a pandemia inflige na divulgação de informações vitais para o público, inclusive no que tange à sustentabilidade dos veículos.

A Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), já havia alertado que a pandemia poderia desencadear em mais ações repressivas. De fato, em todo o mundo a crise causada pelo novo coronavírus exacerbou a censura e a repressão a oposições políticas. Muitos Estados usaram a pandemia como uma oportunidade para intensificar a repressão à liberdade de expressão. É o caso do Brasil, onde mais de 82 violações a jornalistas foram registradas desde que a pandemia chegou ao país. Ainda mais grave é que boa parte dessas violações partiram de membros do Governo Federal, como o Presidente da República e políticos associados. O monitoramento permanente realizado pela ARTIGO 19 revela um cenário em que o descrédito da informação, do trabalho da imprensa e as agressões contra jornalistas são abertamente incentivadas por membros do atual mandato.

Nesse sentido, reiteramos que todas as medidas de resposta à pandemia devem cumprir padrões de legalidade, necessidade e proporcionalidade baseados nos direitos humanos.

A nova resolução pode ser acessada neste link (em inglês).

 

Icone de voltar ao topo