ALERTA: Extinção de diversos espaços participativos, em um ato único e genérico, representa suspensão de práticas essenciais em uma democracia

Ao extinguir toda uma política de participação e inúmeros conselhos, comitês, comissões, grupos, juntas, equipes, mesas, fóruns, salas, governo federal reduz drasticamente espaços participativos e garantias fundamentais em uma sociedade democrática, como a liberdade de expressão e acesso à informação. Decreto 9.759/2019 deve ser revogado com urgência

A ARTIGO 19 expressa profunda preocupação com a publicação do Decreto 9.759, em 11 de abril de 2019, que extingue de uma só vez todos os espaços colegiados – como conselhos, comitês e fóruns – que tenham sido criados por normativas anteriores no governo federal e revoga ainda a Política e o Sistema Nacional de Participação Social, estabelecidos há 5 anos pelo Decreto 8.243/2014, sem propor nada para suprir essas ausências.

Ou seja, o novo decreto de maneira abstrata reduz drasticamente os espaços participativos no seu conjunto no Brasil, prejudicando a capacidade da sociedade civil monitorar e contribuir com políticas públicas e, ao mesmo tempo, cerceando espaços cívicos que ventilam o debate público e fomentam a multiplicidade de opiniões e perspectivas em processos de tomada de decisão.

É preocupante ainda que, mais uma vez, uma medida de impactos tão sérios para a população tenha sido tomada sem diálogo com a sociedade brasileira e com os diversos setores envolvidos nos conselhos existentes. Também que tenha sido executada sem transparência, deixando diversas dúvidas sobre os seus objetivos concretos; quais entre as dezenas de conselhos podem ser impactos; e como o poder executivo pretende suprir a enorme ausência instalada caso tantos órgãos sejam extintos de uma só vez no país.

A ARTIGO 19 alerta para a insegurança jurídica que se instaura diante de um decreto que é abstrato e genérico – o que cria possibilidades de interpretações amplas, incluindo aquelas que podem ir no sentido de restringir direitos e garantias constitucionais. Nesse sentido, a pouca transparência em relação aos critérios e justificativas dos requisitos estabelecidos no decreto para a criação de novos colegiados – que acontece em um contexto de total ausência de informações sobre as diretrizes da nova política pública diante da revogação da Política Nacional de Participação Social – coloca também o risco da sua aplicação se converter em medidas de vigilância da participação da sociedade civil.

“Reforçamos que, ao se extinguir colegiados criados no âmbito do Executivo Federal e a política nacional de participação social, no atacado, se está extinguindo na verdade toda uma prática democrática no país – algo que traz prejuízos para toda sociedade e impacta negativamente em inúmeras áreas que contam com conselhos ou espaços semelhantes no país. O decreto instaura ainda uma insegurança jurídica alarmante”, destaca Laura Tresca, diretora-executiva interina da ARTIGO 19.

Revogação
Tanto pela forma e conteúdo do decreto, quanto por essas ausências e a insegurança jurídica que ele traz, é impensável a sua concretização, sob o risco de grandes retrocessos para o país num momento crítico. A ARTIGO 19 se soma, assim, às organizações que requisitam a revogação do decreto e insta as diversas esferas do poder público brasileiro e os organismos internacionais a exercerem seu papel na defesa de processos participativos e práticas democráticas.

Por fim, lembramos que o decreto contraria os compromissos assumidos pelo Estado brasileiro com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que, entre suas agendas, especifica nas metas do objetivo 16, a necessidade do poder público desenvolver instituições eficazes, responsáveis e transparentes em todos os níveis e de garantir a tomada de decisão responsiva, inclusiva, participativa e representativa em todos os níveis.

Desse modo, a agenda de redução de gastos públicos não pode se converter numa retórica para a desestruturação seletiva de mecanismos participativos e restrição das vias de diálogo entre a sociedade civil e o poder público. Pelo contrário, os colegiados devem ser fortalecidos, contando com o compromisso do Estado e recursos suficientes para seu funcionamento e ainda com a presença de representantes de órgãos públicos para que o diálogo com a sociedade civil realmente ocorra.

Nesse sentido, como parte do Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para a Agenda 2030, nos somamos às mais de 40 organizações de sociedade civil que subscrevem uma nota de repúdio à medida (leia na íntegra).

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