A ARTIGO 19 se soma às organizações que manifestam publicamente sua solidariedade às vítimas do rompimento da barragem da empresa Vale em Brumadinho (MG) e que reforçam a importância de que a prática de crimes ambientais seja investigada com a seriedade e transparência que a situação demanda, garantido que haja responsabilização, acesso à informação e à justiça.
Essa solidariedade se estende ainda a toda população brasileira que é impactada por esse que não é o primeiro desfecho gravíssimo de um contexto de violações ligadas a um modelo de desenvolvimento que, em geral, não prioriza a transparência, o diálogo com as populações impactadas, nem a proteção do meio ambiente e das comunidades atingidas por grandes empreendimentos.
Nesse sentido, também nos somamos às vozes que ao longo dos anos cobram a implementação de medidas de prevenção e de políticas públicas eficazes para evitar tragédias anunciadas – ações cuja a urgência ficaram ainda mais evidentes depois do rompimento da barragem da Samarco em Mariana (MG), em 2015. Ressaltamos a importância de que a transparência seja mais do que nunca uma regra neste caso, a começar por informações para a comunidade local e para os familiares e pessoas próximas das vítimas do rompimento da barragem da Vale.
Transparência e acesso à informação: mais que princípios, passos fundamentais para prevenir o risco de vida
De um modo geral, lembramos que é fundamental que haja o efetivo envolvimento das comunidades atingidas nos processos de tomada de decisão. É inadmissível que escolhas de gestão de barragens sejam realizadas sem diálogo e sem participação da população atingida – não só porque esse é o fundamento de processos democráticos, mas porque a informação e participação podem ser determinantes para não colocar vidas em risco ou para que um plano de emergência seja efetivo.
É importante lembrar que o envolvimento das comunidades é um requisito para a liberação da licença e aprovação do projeto. É um dever das empresas compartilhar o estudo de impacto ambiental dos projetos antes que eles aconteçam e a falta de transparência e participação nessa fase pode barrar a continuidade do projeto.
Com o projeto em curso, é importante que essas práticas sejam mantidas – ou seja, que as medidas de prevenção e os planos de emergência sejam implementados com a participação das comunidades. O acesso à informação para fiscalização periódica também é crucial – as grandes empresas devem deixar acessíveis às comunidades, ao poder público e às organizações da sociedade civil as informações sobre a avaliação dos riscos envolvidos, as medidas de prevenção que vem sendo implementadas e de como os planos de emergência são construídos na região.
Em 2017, a ARTIGO 19, como membro do Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos, participou de missão a Conceição do Mato Dentro (MG) para verificar denúncias relacionadas à implantação do Projeto Minas-Rio, empreendimento minerário da transnacional Anglo American. Nessa ocasião, pode constatar in loco as violações a direitos básicos, incluindo de acesso à informação e liberdade de expressão. Reuniões realizadas ao longo da missão na região demonstraram que nem mesmo os órgãos públicos locais estavam apropriados das informações básicas para a implementação do projeto e sua expansão.
Ressaltamos ainda a importância dos ativistas, defensores de direitos humanos e ambientais, organizações e movimentos sociais que fiscalizam o território, circulam informações, cobram uma atuação mais transparente e humana das empresas, denunciam as irregularidades e exigem seus direitos – que, muitas vezes, ao invés de valorizados enfrentam um cenário de ameaças, violências e inclusive de assassinatos que permanecem impunes.
Importância das leis e políticas públicas sócio-ambientais
Lembramos ainda que o Brasil firmou compromissos internacionais nesse sentido, incluindo a assinatura do Acordo de Escazú em setembro de 2018 – tratado que estabelece os parâmetros para a participação social, acesso à informação e à Justiça em questões ambientais em países da América Latina e no Caribe. Destacamos a importância de que o processo de ratificação do acordo se desenvolva em breve e que o país avance na sua implementação.
A assinatura representa uma importante conquista para a sociedade civil na defesa dos objetivos que o acordo abrange: “garantir a implementação plena e efetiva, na América Latina e no Caribe, dos direitos de acesso à informação ambiental, participação pública nos processos de tomada de decisões ambientais e acesso à justiça em questões ambientais, bem como a criação e o fortalecimento das capacidades e cooperação, contribuindo para a proteção do direito de cada pessoa, das gerações presentes e futuras, a viver em um meio ambiente saudável e a um desenvolvimento sustentável”.
Infelizmente, casos como o da Vale em Brumadinho, da Samarco em Mariana e da Anglo America em Conceição do Mato Dentro mostram que a realidade é outra. É fundamental que as leis sócio-ambientais e os parâmetros internacionais sejam cumpridos no desenvolvimento de grandes empreendimentos no Brasil. Neste momento crítico, a ARTIGO 19 apóia aqueles que defendem estas leis e políticas públicas, ressaltando que elas não devem ser atacadas, minimizadas ou flexibilizadas, sobretudo por agentes do poder público, mas sim aprimoradas e efetivadas nas diferentes realidades vividas no país.
Foto: Corpo de Bombeiros de Minas Gerais