Rede de proteção a comunicadores: articulação para enfrentar violências e defender liberdades de expressão e imprensa

Uma articulação entre organizações da sociedade civil, da imprensa e comunicadores de diversos estados brasileiros está construindo uma rede para fortalecer ações de resistência e prevenção diante das violações e violências sofridas no Brasil. Também para cobrar o Estado brasileiro que cumpra os seus deveres de proteção e responsabilização, inclusive nos muitos casos em que seus próprios agentes são os violadores

Diante de um cenário difícil e de perspectivas de intensificação dos ataques sofridos, organizações da sociedade civil, da imprensa e comunicadores estão se articulando para montar uma rede nacional de proteção no Brasil. As experiências de comunicadores e os relatórios de organizações mostram que é difícil exercer essa atividade em segurança no país: casos de censura, criminalização e processos judiciais para silenciar críticas, ameaças e violências, incluindo assassinatos, revelam violações que são históricas e que se perpetuam num contexto de impunidade para os que cometem os crimes.

A proposta de construir conjuntamente uma rede diante desse contexto foi discutida no Encontro Nacional de Proteção a Comunicadores, que reuniu cerca de 60 pessoas de 11 Estados brasileiros nos dias 4 e 5 de dezembro, em São Paulo. A ideia é compreender as distintas violações que acontecem, trocar experiências e fortalecer ações de resistência, prevenção e responsabilização que ajudem a transformar esse cenário e garantir as liberdades de expressão e imprensa no país. Também de potencializar o apoio entre aqueles que se encontram em situação de risco.

Encontro Nacional de Proteção a Comunicadores


Organizado pela ARTIGO 19, Intervozes, Instituto Vladimir Herzog, Repórteres sem Fronteiras e Abraji, o encontro foi marcado por trocas entre os presentes para compreender as semelhanças e especificidades dos diferentes ataques sofridos por comunicadores num país amplo e atravessado por múltiplas desigualdades.

Comunicadores e comunicadoras que enfrentaram situações de risco e violência levaram suas experiências para o encontro, revelando graves violações de direitos individuais e coletivos. Os temas que atravessaram os relatos – como o racismo estrutural, a violência e discriminação sofrida por mulheres negras comunicadoras, as diferenças regionais e a distinção entre ataques cometidos contra grandes empresas de mídia e comunicadores independentes da periferia ou de fora dos grandes centros urbanos – ajudaram a contextualizar os múltiplos desafios no horizonte. Também reforçam a importância da diversidade de vozes para a efetivação dos direitos à informação e à liberdade de expressão no nosso país.

Ao final do encontro, os participantes e as organizações mobilizadoras pactuaram a realização uma nova reunião nos primeiros meses de 2019 para seguir com a construção da rede de proteção.

Contexto aponta urgência de ações em rede
A articulação da rede proteção acontece num momento importante. Dados da Abraji apresentados durante o encontro indicam que somente no período eleitoral de 2018, foram registrados mais de 130 casos de violência contra jornalistas.

A mais recente edição do relatório anual O Ciclo do Silêncio – Impunidade em Homicídios de Comunicadores mostra ainda que não apenas o jornalista formal se torna vítima pelo exercício de suas atividade profissionais, mas existe um perfil muito variado de comunicadores de todo o Brasil sofrendo crimes graves. O relatório reúne informações sobre 22 casos, entre eles de jornalistas, blogueiros e radialistas que foram assassinados.

Na maioria dos casos, os mandantes dos crimes são políticos e autoridades com poder público – o que coloca um desafio na relação com o Estado, que tem o dever de proteger a população, mas, muitas vezes, é o agente direto da violação de direitos. O estudo revela ainda que 77% das vítimas que foram mortas entre os anos de 2012 à 2016 já haviam recebido ameaças anteriores pela prática do seu trabalho, o que reforça a necessidade do Estado brasileiro cumprir sua obrigação de proteção a esses comunicadores e de responsabilização de quem comete os crimes.

Além dos ataques, foram discutidos ainda os casos em que a intimidação acontece via sistema de justiça. São diversos casos em que os crimes contra a honra (calúnia, injúria e difamação) são usados para limitar a crítica e reprimir o debate público no Brasil, colocando comunicadores sob a ameaça do processo criminal e o risco de penas graves, como aconteceu nos casos de Paulo César de Andrade Prado, detido em novembro deste ano, e de Cristian Góes, condenado em esfera cível e criminal por uma crônica que escreveu.

Informações sobre ações do poder público
Além da troca de experiências entre a sociedade civil, representantes dos poderes públicos participaram do encontro. A Defensoria Pública do Estado de São Paulo, o Ministério Público Federal (MPF) e Ministério dos Direitos Humanos (MDH) apresentaram ações em relação a proteção de comunicadores.

O MDH esteve no encontro para divulgar a recente inclusão de comunicadores no programa federal de proteção a defensores de direitos humanos em risco. O Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores Sociais e Ambientalistas acompanha casos e articula ações e medidas de proteção, de prevenção e de resolução de conflitos em situação de risco e ameaça em todo país e desde setembro ampliou a sua atuação para atender a comunicadores sociais. Nesse sentido, a divulgação do programa para comunicadores em espaços como esse encontro é fundamental (saiba mais).

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