Dia da Luta contra a Violência no Campo: o conflito agrário e a liberdade de expressão

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Resultado da alta concentração fundiária e da grilagem de terras, a violência no campo é infelizmente um traço marcante da história brasileira que segue até hoje fazendo vítimas. Segundo os números do Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos, só em 2016, ao menos 36 pessoas foram assassinadas em decorrência de conflitos agrários.

Entre os casos mais emblemáticos, estão o de Vilmar Bordim e Leomar Bhorbak, dois trabalhadores rurais que foram mortos durante ação da Polícia Militar em assentamento do MST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra) em Quedas do Iguaçu, no Paraná, em abril. O episódio foi citado junto a outros na denúncia feita à Comissão Interamericana de Direitos Humanos e à ONU, também em abril deste ano, sobre o alto número de assassinatos de defensores de direitos humanos no Brasil.

Mais recentemente, no dia 4 de agosto, Ronair José de Lima, de 41 anos, foi morto a tiros em São Félix do Xingu (PA). Presidente da associação de trabalhadores local, Ronair já havia recebido diversas ameaças anteriores, tendo inclusive sobrevivido a uma tentativa de homicídio. Além disso, nos últimos anos, outras cinco pessoas também já foram assassinadas no mesmo assentamento onde vivia o trabalhador rural, evidenciando um padrão de violência sistemática nesse tipo de crime.

Todos esses casos tornam ainda mais importante o Dia da Luta contra a Violência no Campo, celebrado neste 12 de agosto, data que remete ao assassinato da sindicalista e defensora de direitos humanos Margarida Alves, ocorrido em 1983 em Alagoa Grande (PB). Anualmente, diversas organizações aproveitam o dia para realizar atividades com o intuito de chamar a atenção da sociedade para o problema e seu impacto na luta por direitos no país.

Essa situação generalizada de graves violações a direitos humanos no contexto de conflitos no campo tem um efeito perverso na garantia da liberdade de expressão. Na edição de 2014 de seu relatório anual “Violações à Liberdade de Expressão”, a ARTIGO 19 constatou que os conflitos por terra foram a principal causa de violações à liberdade de expressão de defensores e defensoras de direitos humanos naquele ano. O monitoramento da entidade registrou pelo menos 23 vítimas de graves violações ligadas a conflitos de terra, entre lideranças rurais, indígenas e quilombolas.

Considerando a liberdade de expressão como um direito instrumental na luta por outros direitos, é alarmante constatar que esses ativistas são vítimas de ataques por mobilizarem suas comunidades e denunciarem crimes cometidos por pessoas que já possuem controle do poder político e econômico nessas regiões.

Diante deste cenário, algumas iniciativas em nível nacional foram criadas pela sociedade civil para reivindicar junto ao poder público uma atuação enérgica e constante sobre a questão. Uma delas é o próprio Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos, rede composta por diversas organizações e movimentos sociais da qual a ARTIGO 19 faz parte.

O Comitê tem uma atuação histórica no acompanhamento do Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos, mecanismo criado pelo Estado brasileiro para garantir a proteção de pessoas inseridas em contextos de vulnerabilidade e que atualmente se encontra em estado crítico de funcionamento. Justamente por isso, o Comitê tem ampliado sua atuação na luta pela garantia de direitos humanos no país, buscando denunciar e combater as violações contra defensores de direitos humanos em todo o território.

Outra iniciativa é o Fórum por Direitos e contra a Violência no Campo, que foi reativado neste ano em processo conduzido pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão e pelo Ministério Público Federal. O Fórum agrega diversas organizações da sociedade civil e movimentos de indígenas, camponeses, pescadores, quilombolas e comunidades tradicionais.

É dentro desse contexto que a ARTIGO 19 se soma aos esforços de todos e todas que atuam na questão agrária para cobrar o fim da violência no campo e o fim das mortes na luta por direitos no país.

 

Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil | CC BY 3.0 BR

 

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