Sobre a repressão policial em manifestação de estudantes de SP

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A ARTIGO 19 condena veementemente as violações cometidas pela Polícia Militar (PM) durante manifestação realizada ontem (9), em São Paulo, que reuniu milhares estudantes que protestavam contra o fechamento de escolas públicas.

Tendo começado ao fim da tarde, a manifestação saiu da Avenida Paulista e seguiu pela Avenida 9 de Julho. De acordo com alguns veículos de imprensa, mais de 15 mil manifestantes estiveram presentes, enquanto que a PM contabilizou 800 pessoas.

O ato terminou na Praça da República. Foi lá que, segundo a imprensa, agentes policiais passaram a disparar bombas de efeito moral e gás lacrimogênio contra manifestantes. No total, dez pessoas foram detidas de acordo com informações transmitidas pela Secretaria de Segunraça Pública.

Imagens que circulam nas  nas redes sociais mostram policiais com armas de fogo revistando mochilas. Em um vídeo, um policial chega a atrapalhar a gravação feita com o celular por uma pessoa. Há também diversos relatos circulados na imprensa sobre estudantes que foramchutados,agredidos e xingados por policiais, além de equipes de reportagem que foram alvejadas por gás de pimenta durante a cobertura da manifestação.

Durante a noite, segundo testemunhas, jovens foram perseguidos e agredidos por policiais nos arredores do Teatro de Arena Eugênio Kusnet. Ainda segundo os relatos, um jovem ensanguentadofoi prensado contra a parede do teatro e policiais chegaram a entrar no espaço para agredir outros dois jovens.

A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP) rapidamente soltou uma nota à imprensa sobre o ocorrido ainda na noite de ontem. Na nota, a instituição afirma que foi “absolutamente necessária a intervenção da PM no fim do protesto” e justifica dizendo que os manifestantes iniciaram uma depredação do patrimônio público e agrediram policiais antes da PM iniciar seu protocolo padrão de repressão ao protesto.

As afirmações feitas na nota levantam algumas sérias preocupações. A primeira delas está   no segundo parágrafo e diz que a “atitude de grupos de manifestantes deixou clara a motivação política e criminosa dessa quarta, com diversos black blocs com o rosto encoberto, integrantes da Apeoesp e pessoas ligadas a partidos políticos, vestidos com camisetas da Juventude Comunista”.

Em primeiro lugar, as imagens disponibilizadas pela SSP na nota por meio de fotos e vídeos não nos permitem afirmar que os perfis de manifestantes citados estavam envolvidos com as ações de violência e conflito com a polícia. Ainda que estivessem, a postura isolada de alguns manifestantes em um protesto com um enorme contingente de pessoas não pode ser compreendida de forma generalizada e abrir margem para que uma instituição pública deslegitime o envolvimento de todos esses grupos citados pela secretaria.

Afirmar que ideologias políticas e filiações a sindicatos ou entidades representativas ensejam comportamentos “criminosos” é uma postura que, além de não respeitar as liberdades individuais, pode de maneira preocupante encorajar perseguições e intolerâncias à diversidade de ideologias, um pilar essencial para qualquer sistema democrático. As liberdades de associação política, ideológica, bem como a liberdade de expressão são direitos que precisam ser assegurados e protegidos pelas instituições públicas do nosso país.

Além disso, é preciso mais uma vez relembrar o papel das forças de segurança em uma manifestação e a necessidade de que os agentes de segurança tenham protocolos claros de como atuar em manifestações para que cenas como essas parem de se repetir. A defesa do patrimônio público não justifica ações abusivas de violência física contra manifestantes, ainda que estes direcionem suas ações contra edifícios que representam essas instituições.

A polícia, representante do Estado em um contexto de protesto, deve agir com responsabilidade e com o objetivo de resguardar a manifestação. Já vimos em outras manifestações que a PM tem perfeitas condições de intervir diretamente nos focos de conflito de uma manifestação, garantindo que eles sejam resolvidos sem que outras pessoas presentes sofram as consequências de um uso desproporcional e perigoso de armamento menos letal, como bombas de gás e balas de borracha.

As cenas documentadas na noite de ontem mostram a PM de São Paulo agindo mais uma vez de maneira desproporcional e abusiva. Perseguição de manifestantes aleatoriamente pelas ruas do centro, agressões físicas deliberadas, uso injustificável de arma de fogo (veja vídeo do jornalista Gustavo Basso) e detenções arbitrárias são ações que demonstram que os agentes de segurança não estão cumprindo as suas funções e deveres constitucionais e, ao fazerem isso, atropelam direitos. 

Um dia após o Dia Internacional dos Direitos Humanos, celebrado ontem (10), a ARTIGO 19 faz um apelo para que a SSP reveja o seu pronunciamento no sentido de avançar na proteção e garantia do direito humano à liberdade de expressão e manifestação pública.

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