Na quarta-feira foi julgado pela 5ª Turma do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo o caso do engenheiro e ativista Ricardo Fraga Oliveira, fundador do Movimento o Outro Lado do Muro, proibido por liminar de se manifestar contra um empreendimento imobiliário da construtora Mofarrej Vila Mariana SPE Empreendimento Imobiliário S/A.
Os desembargadores julgaram os dois recursos interpostos com relação à decisão que proibiu Ricardo Fraga de se manifestar no raio de 1 km da obra e pelo facebook, na página do movimento. Um deles, interposto por Ricardo, pedia a reversão total da decisão, o outro, interposto pela construtora, pedia para que a página do movimento fosse excluída.
No julgamento, que contou com a filmagem da TVAssim e transmissão ao vivo pela Post-tv, o desembargador relator Moreira Viegas disse se tratar de um caso de colisão de direitos fundamentais, de um lado o direito à livre iniciativa privada, de outro o direito de liberdade de expressão e direito de reunião, visto que a liberdade de expressão não é um direito absoluto e encontra limites em outros direitos.
Os desembargadores decidiram manter a decisão de primeira instância quanto a retirada de todo o material da página do Facebook que fizesse referência à empresa e à obra (na prática todo o conteúdo da página, o que significa uma decisão favorável ao recurso interposto pela construtora), pois segundo eles o conteúdo seria “ofensivo” à imagem da empresa. Além disso, os desembargadores alteraram o raio de restrição de manifestação de Ricardo, o qual passou de 1 km para um quarteirão da obra, alegando que a primeira medida seria desproporcional.
Na prática a decisão de primeira instância não foi alterada, ou seja, a censura contra Ricardo foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, pois o engenheiro permanece proibido de se manifestar pela internet e no entorno da obra. Para Camila Marques, advogada do Centro de Referência Legal da Artigo 19, a decisão abre um precedente negativo à liberdade de expressão online. “Trata-se de um dos primeiros casos em que se julga protesto online no Brasil e o julgamento não observou os padrões internacionais relativos a liberdade de expressão na internet”, afirma.
Os padrões internacionais apontam que as restrições somente serão legítimas caso haja necessidade social e deverá se utilizar da medida menos intrusiva. Contudo, os desembargadores não consideraram que os direitos de propriedade e de livre iniciativa não estavam sendo barrados ou interrompidos pelo protesto. Além disso, também foi desconsiderado o interesse público inerente ao movimento de Fraga e justificado pelas consequências da obra no bairro e nos seus moradores.
Ressalta-se que, em caso de colisão de direitos, a medida menos restritiva deverá ser buscada. “Caso a restrição fosse necessária, o Judiciário deveria buscar outras saídas menos intrusivas do que o bloqueio total das manifestações na internet e a proibição de se aproximar da obra”, complementa Camila Marques.
Sendo assim, a Artigo 19 entende que a decisão dos desembargadores, sob o ponto de vista dos padrões internacionais e princípios constitucionais, foi desproporcional e desnecessária. Apesar de ter supostamente recorrido a uma “ponderação” dos direitos, a decisão revelou que os direitos em colisão no caso Fraga foram balanceados de forma equivocada, visto que houve a anulação total da liberdade de expressão.
No momento em que foi proferida a decisão, a Artigo 19 e outros apoiadores de Ricardo, presentes no local para acompanhar o julgamento, realizaram um ato contra a restrição imposta ao ativista pelo judiciário paulista, colocando faixa pretas sobre a boca e se levantando perante o tribunal em apoio à Ricardo.