Uma opinião aprovada num recente encontro de juízes federais, promotores e especialistas abre caminho para que informações sejam apagadas da internet, por ordem judicial, com o objetivo de preservar a imagem de pessoas que se sentirem atingidas.
Trata-se do “direito ao esquecimento”, sugestão apresentada na “6ª Jornada de Direito Civil”, do Conselho da Justiça Federal, em março.
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A ideia foi divulgada como orientação doutrinária, o “Enunciado 531”. O texto tem redação genérica, não obriga juízes a seguir a recomendação, mas pode fundamentar decisões judiciais e estimular pedidos para apagar reportagens e dados históricos.
O advogado Manuel Alceu Affonso Ferreira, especialista em legislação de imprensa, diz que o enunciado é “um retrocesso” e “colide com a liberdade de imprensa”.
“É simplista demais, pois não faz a ressalva da intimidade da pessoa pública. Quem teve projeção na história não tem direito a ser esquecido”, afirma Ferreira.
O autor da proposta é o promotor de Justiça Guilherme Magalhães Martins, do Rio de Janeiro. Ele é professor de direito civil e autor de livros sobre a internet.
“A função é pedagógica, para estabelecer limite aos meios de comunicação na internet, onde a liberdade de expressão não é absoluta”, diz.
Ele cita os casos de condenados criminalmente que, anos depois do cumprimento da pena, buscam se reintegrar à sociedade. “Como a internet não ‘esquece’, ela gera um juízo de reprovação eterno”, afirma o promotor.
Para o presidente da comissão que tratou do tema, o juiz federal Rogério Fialho Moreira, “bem medido e aplicado, o direito ao esquecimento não constitui censura”. “Os danos causados por informações falsas na internet, ou mesmo verdadeiras, mas da esfera da vida privada, são potencialmente muito mais nefastos do que a divulgação pelos meios tradicionais na época dos fatos.”
Moreira ressalva que “o resguardo à privacidade não pode apagar a história nem tolher o direito da imprensa de divulgar fatos de interesse público”.
Ele diz que os provedores de pesquisa na internet, por exemplo, não poderiam bloquear a menção ao coronel Ubiratan Guimarães em pesquisas sobre o massacre do Carandiru, em São Paulo.
Voto vencido, Moreira queria obter “um certo consenso” em torno do enunciado. Eventual alteração ou revogação só pode ser feita em novo encontro, daqui a dois anos.
Alexandre Jobim, diretor do Comitê de Assuntos Jurídicos da ANJ (Associação Nacional de Jornais), espera que o Judiciário não siga a orientação sem ampla discussão. Até porque o enunciado tem natureza doutrinária, sem efeito vinculante (decisão que passa a valer para processos idênticos).
“Compreende-se a vontade de quem pretende obter o direito ao esquecimento, mas não podemos ignorar registros históricos, positivos ou negativos, de determinadas pessoas. A simples exclusão pode configurar atentado à liberdade de expressão”, diz Jobim.
Para Orlando Molina, diretor jurídico da Empresa Folha da Manhã, que edita a Folha,”excluir textos jornalísticos legítimos, sob qualquer argumento, significa suprimir de todos o direito ao conhecimento da verdade dos fatos e da história”.
Fonte: Frederico Vasconcelos – Folha de S. Paulo. Publicado em 04/05/2013.