Acecci: comunidade em rede social origina movimento de combate à corrupção e controle social no Ceará

Por Jamila Venturini, especial para a ARTIGO 19

 

Foi através das redes sociais que Francisco de Assis Soares descobriu que não era o único incomodado com os problemas sociais e a corrupção no estado do Ceará. Inspirado pelo trabalho da Amarribo e por um curso sobre controle social que fazia na época, o ex-militar da Marinha criou em 2009 uma comunidade no Orkut que chegou a ter 1.400 participantes.

Do Orkut, a comunidade online foi para um site chamado Ação Cearense de Combate à Corrupção e à Impunidade (Acecci). Ao mesmo tempo, aos poucos se conformava um movimento social reunindo ativistas de todo o estado para atuar no combate à corrupção e controle social em diferentes cidades.

 

Monitoramento e capacitação para o controle social

Uma das grandes preocupações do movimento é a mobilização da sociedade civil para o controle social das contas públicas. Assim, uma das estratégias utilizadas pela Acecci no início foi promover e divulgar audiências públicas. Em 2010, o grupo estimulou a realização de uma audiência pública na Assembleia Legislativa do Ceará para discutir a situação dos pequenos municípios do interior do estado que sofrem com inúmeros problemas sociais. Aos poucos o grupo foi se tornando referência para a imprensa para discutir temas relacionados à corrupção e à fiscalização dos gastos públicos (veja entrevista com Francisco de Assis Soares ao jornal O Povo).

No entanto, mais do que conscientizar sobre a necessidade de se acompanhar a execução do orçamento público, a Acecci tem uma preocupação especial com a capacitação. “Para fazer o controle social, o cidadão precisa ter um conhecimento mínimo sobre algumas questões técnicas e jurídicas, como as leis de licitações e a lei de responsabilidade fiscal”, opina Assis.

Buscando tornar esses conhecimentos acessíveis à população, a Acecci organizou um seminário de capacitação para o controle social das contas públicas em Fortaleza. O evento, que aconteceu em março de 2012, reuniu palestrantes da Controladoria Geral da União (CGU), do Ministério Público Estadual, da Advocacia Geral da União (AGU), entre outros. Também estiveram presentes ativistas no combate à corrupção de outros estados que compartilharam suas experiências com participantes de mais de 30 municípios cearenses, além de organizações como a Artigo 19 e o Instituto Ethos.

Em 2012, dando continuidade ao diálogo iniciado no seminário, o grupo promoveu uma série de oito palestras sobre temas relacionados ao controle social, ao combate à corrupção e ao acesso à informação pública em distintas cidades cearenses. O objetivo do ciclo de palestras foi divulgar à sociedade a Lei de Acesso à Informação brasileira e promover o seu cumprimento. Para isso foram realizados encontros com a sociedade civil e também com agentes públicos.

Desde a sua formação, a Acecci também monitora as atividades do poder público, denunciando os indícios de irregularidades nos municípios. Em uma de suas últimas ações, por exemplo, o grupo apresentou uma representação ao Ministério Público apontando diversas irregularidades relativas à compra de grandes quantidades de materiais de consumo em Antonina do Norte, município de 6.984 habitantes (IBGE/2010). Foram produtos de limpeza, material de expediente e gêneros alimentícios comprados pelas Secretarias de Saúde,  Educação, Ação Social e Administração e Finanças utilizando recursos do SUS, do Fundo de Manutenção da Educação Básica (Fundeb), entre outros.

 

Dificuldades

Segundo Assis, uma  das maiores dificuldades  do movimento para concretizar o seu trabalho cotidiano de controle social é a falta de estrutura e suporte. Atualmente a Acecci funciona com o trabalho voluntário de seus participantes e se sustenta financeiramente com doações de alguns de seus membros.

A suspensão do site do movimento é um exemplo do que pode implicar essa falta de estrutura. Desde que o site foi criado, seus gastos – como domínio, servidor, etc. – eram debitados na conta pessoal de Assis. Ele, porém, teve um problema com seu cartão de crédito e a página, o principal meio de comunicação da Acecci, foi suspensa, encontrando-se atualmente fora do ar (atualmente o grupo possui um canal informativo, o www.acecci.org). “Tentei recuperar e fazer os pagamentos em boleto bancário, mas não foi possível, eles só aceitam cartão de crédito”, conta Assis.

Por outro lado, a perseguição contra os que se expõem ao investigarem e denunciarem irregularidades no estado também é uma grande preocupação. Na cidade de Antonina do Norte, por exemplo, um dos membros do movimento chegou a ser agredido em praça pública e ameaçado de morte em 2011. Nos outros municípios, as ameaças são comuns, ainda que nem sempre cheguem a esse extremo. “Os administradores sempre estão nos olhando de lado, sempre aparecem ameaças veladas”, conta Assis.

 

Avaliação e projetos futuros

Num momento eleitoral, Assis não era muito otimista com relação aos futuros governantes dos municípios cearenses. “Infelizmente os candidatos continuam na concepção antiga, não percebem que as coisas estão evoluindo”, opina, referindo-se aos avanços legislativos relativos ao controle social e ao combate à corrupção. “Quem se eleger tem que se preparar para fornecer informação ao cidadão”, diz.

Se depender da Acecci, porém, os novos prefeitos não vão ter facilidade em desviar o dinheiro público. O grupo pretende dividir-se em grupos permanentes para monitorar de maneira mais sistemática os municípios do estado. A ideia é formar pequenos grupos para visitar cada cidade com as cópias de todos os seus convênios com os governos federal e estadual e verificar no local se eles foram devidamente executados. “Aguardamos a oportunidade de conseguir apoio financeiro para a realização desse projeto”, conta Assis. Para facilitar o estabelecimento de parcerias, o grupo pretende transformar-se numa Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip). A Acecci é parte da Rede Amarribo Brasil e da Articulação Brasileira de Combate à Corrupção e à Impunidade (Abracci).

Assis finaliza compartilhando um pensamento do ativista Martin Luther King e que, segundo ele, é sua força íntima: “É melhor tentar e falhar, que preocupar-se e ver a vida passar. É melhor tentar, ainda que em vão que sentar-se, fazendo nada até o final. Eu prefiro na chuva caminhar, que em dias frios em casa me esconder. Prefiro ser feliz embora louco, que em conformidade viver”.

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