Novo relatório analisa violações contra comunicadores brasileiros registradas em 2017

 

A ARTIGO 19 lança nesta quinta-feira (3) o relatório “Violações à Liberdade de Expressão – 2017”, estudo anual da entidade que registra e analisa as graves violações cometidas contra comunicadores no Brasil. O lançamento ocorre na mesma data em que se celebra o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa.

Baixe o relatório

Em sua sexta edição, o relatório, que traz as violações contra comunicadores registradas em 2017, aponta que as principais tendências que marcam o cenário de hostilidade à liberdade de expressão no país seguem basicamente as mesmas.

Foram registradas ao todo 27 violações, sendo 21 ameaças de morte, quatro tentativas de assassinato e dois homicídios. Apesar da ligeira redução em comparação ao relatório do ano passado – que registrou 31 violações –, os números continuam altos em relação a outros países e próximos da média histórica brasileira.

O Nordeste continua sendo a região que concentra o maior número de violações, com 56% dos casos. Já na divisão por Estados, o Ceará aparece em primeiro lugar, com sete registros de violações no total. Foi nesse Estado que também ocorreram os dois únicos homicídios registrados.

No recorte por tamanho de cidade, o padrão segue o mesmo em relação aos últimos anos. A grande maioria das violações (69%) se deu em cidades pequenas, com menos de 100 mil habitantes, enquanto que as cidades médias (entre 100 e 500 mil habitantes) registraram 23% dos casos. Já nas cidades grandes (mais de 500 mil habitantes) aconteceram 8% das ocorrências apuradas.

Os agentes públicos e políticos são suspeitos de terem atuado como executores ou mandantes das violações em 70% dos casos. Na análise das motivações que levaram às violações, a realização de denúncias foi a mais comum (67% dos casos), seguido pela emissão de críticas e opiniões (26%) e a realização de investigações jornalísticas (7%).

Uma análise inédita do relatório buscou cruzar a ocorrência das violações com os dados existentes no “Atlas da Notícia”, uma iniciativa do Projor – Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo e do VoltDataLab que mapeia os jornais impressos e online de todo o Brasil. O resultado mostrou que quase a metade das violações ocorreu no chamado “deserto de notícias”, classificação empregada às cidades que não possuem nenhum veículo de imprensa periódico.

A constatação é grave, pois mostra que essas cidades tendem a permanecer sem a produção e circulação de notícias de interesse público uma vez que não há veículos estruturados que cubram questões locais. Além disso, nessas regiões as violações ocorrem geralmente contra blogueiros e comunicadores independentes, que além de estarem mais vulneráveis, acabam sendo o único meio de informação.

Esse complexo cenário de hostilidade e violência em regiões já pouco atendidas por veículos de comunicação contribui para um processo de autocensura de comunicadores locais, intensificando ainda mais o problema.

Homicídios e impunidade

Os dois casos de comunicadores assassinados tiveram blogueiros como vítimas e ocorreram no Ceará. Um deles era Francisco José Rodrigues, conhecido como Franzé. Ex-radialista, ele mantinha uma página no Facebook na qual comentava sobre crimes na região de Morada Nova (CE), onde morava. No dia 11 de agosto de 2017, foi morto com tiros disparados por dois homens enquanto saía da casa de sua mãe.

A denúncia de crimes também era tema presente no blog de Luís Gustavo da Silva, de Aquiraz (CE). No dia 14 de junho de 2017, o comunicador foi assassinado na porta de sua casa.

Os dois casos confirmam uma tendência no que diz respeito ao perfil das vítimas de homicídios no estudo. Desde 2012, quando a ARTIGO 19 iniciou o monitoramento das violações à liberdade de expressão no Brasil, quase 40% dos comunicadores assassinados eram blogueiros.

Os homicídios, e as demais violações de forma geral, também são reflexo da impunidade sistêmica nesses tipos de crime. Segundo a apuração da ARTIGO 19, de todas as 27 violações registradas em 2017, apenas em quatro a investigação deu início a uma ação penal. Em seis delas, a investigação não avançou e em quatro as vítimas não procuraram as autoridades, seja por descrença na iniciativa das autoridades em investigar o caso, seja por desconfiar do envolvimento da polícia nas próprias violações.

Diante desse quadro, a ARTIGO 19 reitera as críticas ao Estado brasileiro, que não tem tomado nenhuma medida para atacar o problema, nem mesmo as mais pontuais, a despeito dos diversos alertas e recomendações apresentados pela sociedade civil nos últimos anos. A preocupação atual é ainda maior pelo fato de 2018 ser um ano eleitoral, quando, historicamente, o número de violações contra comunicadores aumenta.

Caso essa tônica permaneça, a expectativa é que as violações a comunicadores sigam ocorrendo com o mesmo padrão que vem sendo registrado nos últimos anos. Tal cenário acarreta não apenas danos físicos e psicológicos às vítimas, mas também prejudica toda a sociedade, que se vê privada de informações em decorrência das violações e da autocensura que um cenário hostil a comunicadores provoca.

 

Postado em

Icone de voltar ao topo