ARTIGO 19 repudia emenda que legaliza censura nas eleições brasileiras

A ARTIGO 19 repudia a aprovação de emenda nº 6 na Lei Eleitoral (Lei 9.504/1997), que obriga sites e redes sociais a removerem conteúdo, em até 24 horas, que candidatos e partidos políticos considerarem “ofensivo” durante o período de eleições. Proposta pelo deputado Áureo (SD-RJ), a nova regra foi aprovada na Câmara dos Deputados e no Senado nesta quinta-feira (5) e deve ir ainda nesta sexta (6) à sanção do presidente Michel Temer, que já anunciou a intenção de vetá-la.

Para a ARTIGO 19, a emenda nº 6, caso passe a valer, representaria a legalização da censura no Brasil, ferindo o direito constitucional à liberdade de expressão. Além disso, o dispositivo atenta frontalmente contra o Marco Civil da Internet, que garante que um conteúdo só poderá ser removido da internet mediante decisão judicial. Em seu artigo 19, a lei diz que:

“O provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.”

É importante salientar que, caso o Judiciário seja destituído do poder de decidir pela remoção ou não de conteúdos da internet, seriam grandes as chances da ocorrência de abusos, com a solicitação de remoções de conteúdos legítimos se tornando algo corrente. Nesse cenário hipotético, o papel de juiz seria transferido a empresas, que muito provavelmente optariam pela remoção de conteúdos da internet o mais rápido possível a fim de evitar ações judiciais e perdas econômicas.

Outro ponto que merece destaque é que a garantia de que a remoção de conteúdos só ocorra mediante decisão judicial está amplamente amparada por documentos de referência internacional. Um dos principais deles é a Declaração Conjunta sobre a Liberdade de Expressão e a Internet, publicada em 2011, por relatores para a liberdade de expressão da ONU, OEA, OSCE (Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa) e a CADHP (Comissão Africana de Direitos Humanos e dos Povos).

Em certa altura, a declaração diz:

(i) Ninguém deve ser responsabilizado por conteúdo produzido por outros na prestação de serviços técnicos de internet – tal como acesso, busca, transmissão ou guarda de informações na memória cachê;

(ii) A responsabilização só deve acontecer se o intermediário interveio especificamente no conteúdo que está publicado on-line;

(iii) Provedores de serviços de internet e outros intermediários só devem ser obrigados a retirar conteúdos seguindo uma ordem judicial, ao contrário da prática de aviso prévio e remoção

Justificativa frágil

A justificativa alegada pelo deputado Áureo para que a emenda contrarie a Constituição e o Marco Civil da Internet seria a natureza especial do período de eleições, quando casos de difamação, discurso de ódio e conteúdos ofensivos aumentam exponencialmente na internet.

No entanto, a ARTIGO 19 acredita que a época das eleições não pode ser tomada como prerrogativa para a limitação ou supressão do direito à liberdade de expressão. Ao contrário, é justamente nesse período que cidadãos e cidadãs devem ser estimulados a discutir, criticar e formular suas opiniões acerca das possibilidades políticas que possuem, algo que a emenda aprovada no Congresso visa sufocar.

Outro argumento levantado pelo deputado Áureo é que a mudança proposta na Lei Eleitoral buscaria limitar a utilização de robôs e perfis falsos, uma prática que tem crescido exponencialmente nos períodos de eleições. Trata-se, efetivamente, de um problema real, mas para o qual se oferece uma solução totalmente descabida.

Para a ARTIGO 19, não é admissível que o Brasil torne legal uma medida que pode gerar mais censura sobre o debate público, sobretudo no atual momento de crise política pelo qual o país passa. Por isso, esperamos que o presidente Michel Temer cumpra com o que anunciou e vete a emenda nº 6 à Lei Eleitoral prontamente.

 

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