Copa do Mundo 2018: autoridades russas devem respeitar os direitos LGBTs

 

Na abertura da Copa do Mundo de 2018, a ARTIGO 19 pede às autoridades russas que parem de negar às pessoas LGBTs seus direitos humanos básicos.

“As pessoas LGBTs na Federação Russa enfrentam significativos casos de violência e discriminação liderados pelo Estado e até mesmo consagrados em suas leis. A ARTIGO 19 pede a revogação da legislação repressiva, como a ‘proibição da propaganda homossexual’, que é usada para censurar e estigmatizar pessoas LGBTs e impedi-las de acessar informações e receber apoio”, afirma Thomas Hughes, diretor-executivo-global da ARTIGO 19.

“A situação é particularmente terrível na Chechênia, onde as pessoas têm sido detidas, espancadas e torturadas por agentes de segurança pela suspeita de serem gays. Em vez de condenar esses episódios, as declarações das autoridades chechenas parecem incitar mais violência”, acrescenta.

Algumas das formas pelas quais os direitos das pessoas LGBTs são atacados incluem:

Discurso de ódio aos grupos LGBTs

O discurso de ódio é impulsionado pelo Estado russo e reforçado pela legislação. São frequentes as declarações públicas e em redes sociais por agentes do Estado atacando grupos LGBTs, as quais acabam sendo ecoadas nos veículos pró-governo.

Um exemplo é o de Vitalii Milonov, membro do partido governista Rússia Unida, que frequentemente ataca pessoas LGBTs em publicações nas mídias sociais e em discursos públicos.

A mera presença de ativistas LGBTs na esfera pública é sempre seguida por ataques feitos pelo político. Milonov chegou a se referir a ativistas LGBTs presentes em um protesto cívico contra a transferência da propriedade da Catedral de São Isaac, em São Petersburgo, para a igreja ortodoxa russa como “bichas loucas, insufladas por seus líderes, que nada têm a ver com nossas tradições”.

Foi também de Milonov a sugestão para que o Ministério da Cultura russo proibisse a versão recente do filme “A Bela e a Fera”, segundo ele, porque continha um personagem gay. O filme infantil acabou recebendo a classificação indicativa de 16 anos. No episódio, o político afirmou:

“Este é um filme que mostra pervertidos. As crianças não devem assistir a esses patifes neoliberais. Os adultos têm a capacidade de avaliar o quanto estão interessados ​​em olhar para esses pervertidos. O objetivo deste filme é incutir em nossas crianças russas novos padrões de tolerância europeus, para que eles considerem tudo isso como norma, mas felizmente, graças a Deus, o Ministério da Cultura demonstrou sua responsabilidade cívica e tratou desse problema”, afirmou.

Outro exemplo é o ocorrido em março de 2017, quando o site News47 publicou comentários de Sergey Davidov, chefe da administração da prefeitura da cidade russa de Svetogorsk, que afirmavam que “nunca houve pessoas gays e nunca haverá, e que eles não vão invadir [a Rússia], nem mesmo vindos do Ocidente.

Proibição da “propaganda homossexual”

Em 2013, a Rússia aprovou uma lei que ficou conhecida como “proibição da propaganda homossexual”, sob o pretexto de “proteger” os jovens. A lei torna ilegal a “promoção de relações sexuais não tradicionais a menores de idade”. Desde que foi implementada, a lei tem sido usada para multar pessoas LGBTs e bloquear sites que promovam apoio a esse grupo.

Alguns dos casos em que a lei foi aplicada:

  • Sergey Alekseenko, um ativista LGBT baseado em Murmansk, foi multado em 100 mil rublos pela publicação de um conteúdo na página de mídia social de um grupo que fornece apoio legal e psicológico para pessoas LGBTs, no dia 18 de janeiro de 2016.
  • Em janeiro de 2015, o Deti-404, uma comunidade on-line de apoio e aconselhamento para jovens LGBTs, foi bloqueada sob a alegação de ter “promovido a homossexualidade” entre menores de idade. Uma semana depois, as contas da mídia social da comunidade foram bloqueadas por supostamente promover o suicídio, devido a um post sobre sentimentos suicidas de um membro da comunidade.
  • Evdokia Romanova, membro da Coalizão da Juventude pelos Direitos Sexuais e Reprodutivos, foi processada em setembro de 2017 por conta da publicação de links para textos sobre direitos LGBTs nas redes sociais

Uso de discurso de ódio e legislação antiextremista

Uma lei para combater o extremismo tem sido usada para atacar críticas e divergências às políticas do Estado russo, inclusive  aquelas feitas por ativistas LGBTs.

Um exemplo é o do ativista LGBT Konstantin Golava, que em 2015 foi acusado de disseminar materiais extremistas por conta de publicações em redes sociais feitas em 2014. No episódio, ele replicou um meme que criticava os defensores da política russa, tendo também publicado um poema ridicularizando partidários de Stalin e os defensores da anexação da Crimeia.

As acusações contra Golava incluíam “incitamento ao ódio contra um grupo social”, no caso, “cidadãos russos”, segundo o Artigo 282 do Código Penal russo. O ativista acabou buscando refúgio na Suécia para evitar processos judiciais.

Sites LGBTs bloqueados

Uma lei que proíbe “ações públicas que expressem desrespeito pela sociedade e que visem insultar os sentimentos religiosos de pessoas devotas” tem sido usada para bloquear sites LGBTs. A lei foi introduzida em julho de 2013 e pode ser usada para a aplicação de penas de até um ano de prisão.

Proibição de marchas e manifestações LGBTs

A proibição de marchas e manifestações LGBTs ainda estigmatiza as pessoas LGBTs e nega a elas o direito de se expressarem. A lista de eventos banidos inclui:

  • Parada do Orgulho LGBT de Moscou (banida desde 2006)
  • Dia Internacional Contra a Homofobia, Bifobia e Lesbofobia – um pedido para se reunir em São Petesburgo por conta da data foi indeferido em São Petersburgo em maio de 2016
  • Parada do Orgulho LGBT no Círculo Polar Ártico (banida em janeiro de 2017)

Chechênia

Em 2017, o Novaya Gazeta, um jornal independente russo, informou que mais de 100 homens foram detidos, espancados e torturados por agentes policiais pela suspeita de serem gays

Em 1º de abril de 2017, Alvi Karimov, porta-voz de Ramzan Kadyrov, chefe da República da Chechênia, declarou: “Você não pode prender ou reprimir pessoas que não existem. Se essas pessoas existissem na Chechênia, as autoridades não teriam nenhum problema com elas, pois seus próprios parentes as teriam enviado para um lugar do qual jamais voltariam.”

Kadyrov chegou a ser fotografado com o jogador Mohamed Salah, que integra a seleção do Egito e cuja base de treinamento para a Copa do Mundo de 2018 fica na Chechênia.

Foto: mos.ru | Creative Commons 4.0

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