Apesar de problemas, entidades da sociedade civil veem avanços nos dois anos da LAI

Eventos LAI 2 Anos
Imagem do debate “Dois anos da Lei de Acesso à Informação”, realizado no último dia 15

 

Na semana em que a Lei de Acesso à Informação (LAI) completou seu segundo aniversário, dois debates em São Paulo discutiram o assunto.

Realizado na quinta-feira (15), na sede da Apesp (Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo), o debate “Dois anos da Lei de Acesso à Informação: o caminho da transparência e as práticas de acesso à informação” reuniu representantes da ARTIGO 19, da CGM (Controladoria Geral do Município), do GPOPAI-USP (Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação), do Instituto Ethos, e da Retps (Rede pela Transparência e Participação Social).

O evento foi aberto pelo presidente da Apesp, Caio Cesar Guzzardi, que apontou as dificuldades de acesso à informação mesmo para os que estão no funcionalismo público. “Apesar de estarmos dentro da Procuradoria, ainda assim encontramos dificuldades com acesso à informação junto ao Estado. Se é difícil para nós, imagina para quem está fora da estrutura”, se queixou.

Em seguida, foi a vez de Fernanda Campagnucci falar sobre o trabalho da CGM em promover a Lei de Acesso à Informação (LAI) junto aos órgãos públicos municipais. Segundo Campagnucci, a Prefeitura de São Paulo hoje respeita mais o direito ao acesso à informação pública do que antes, mas ainda há muitos desafios a serem superados. “Hoje já não existe pedido de informação que não tenha manifestação por parte das secretarias. Mas elas têm qualidade? Esse papel de monitorar é um papel da controladoria e hoje não temos segurança pra dizer que todas as respostas estão sendo dadas com qualidade. Entretanto é uma preocupação nossa”, afirmou.

Jorge Machado, do GPOPAI-USP, apresentou dados sobre o “Estudo sobre Desafios da Transparência no Sistema de Justiça Brasileira”, uma publicação do GPOPAI-USP, da ARTIGO 19 e da FGV (Fundação Getúlio Vargas). O estudo analisou o grau de transparência das instâncias do Poder Judiciário. “Neste quesito, a Justiça está aquém do Executivo e muito provavelmente atrás do Legislativo”, constatou. Apesar dos problemas, o pesquisador disse que é possível perceber avanços. “Tem razões para se reclamar e para se comemorar. Se olharmos para trás, as coisas avançaram. Há ainda que vencer resistências culturais, mas na transparência ativa, nos serviços dos sites, é possível ver que o Brasil, comparado ao outros países, avançou bastante.”

Falando em nome do Instituto Ethos, Bruno Videira discorreu sobre o projeto Jogos Limpos, que, entre outros objetivos, busca fazer uma avaliação da transparência nos governos nas 12 cidades-sede da Copa do Mundo no Brasil. “Elaboramos o Pacto pela Transparência Municipal e fizemos todos os candidatos a Prefeitura assiná-lo. Depois começamos a monitorar para ver se o cumpriam ou não”, contou. Segundo Videira, com a produção de rankings de transparência, foi possível verificar avanços. “Um caso interessante foi o de Brasília, que no ranking de 2013 ficou em último lugar. O governo então começou a se mexer e pôr a casa em dia e já no ranking de 2014, a cidade passou ocupar o posto de a mais transparente entre as 12 cidades-sede da Copa”, revelou Videira, que concluiu com um comentário otimista. “Fala-se tanto sobre quais são os legados positivos da Copa. Esperamos pelo menos que a transparência seja um deles.”

Joara Marchezini, da ARTIGO 19, falou sobre o “Relatório de Monitoramento da Lei de Acesso à Informação”, o qual ajudou a produzir. “Buscamos avaliar 51 órgãos no nível federal, entre setembro e dezembro e 2013, por uma metodologia dividida entre transparência ativa e passiva”, explicou. O relatório também constatou a Justiça (categoria que engloba órgãos do Judiciário mais outros órgãos ligados a ele, como o Ministério Público) como a esfera que mais deixou a desejar no quesito transparência. “Houve vários problemas constatados. Em alguns casos, ligaram perguntando o motivo de pedidos de informação feitos ou então exigiram cópia autenticada de documentos pessoais. Trata-se de exigências que não estão previstas pela Lei de Acesso à Informação”, informou.

Por fim, Fernando Meloni falou sobre as conquistas da Retps, rede que representa 13 entidades e que busca fomentar mais transparência nos órgãos públicos. “Tivemos um papel importante para a criação da Conferência Municipal sobre Transparência e Controle Social, na revisão do decreto municipal que regulamenta a LAI em São Paulo, e também na divulgação da relação de cargos e funcionários de empresas públicas das três esferas”, afirmou. Ainda assim, de acordo com Meloni, houve algumas “brigas” que não foram possíveis de se vencer. “Infelizmente, em uma série de pedidos de informação não conseguimos obter respostas. Houve casos, por exemplo, em que o órgão de controle dizia para liberar a informação mas o órgão responsável não liberava. Como não há sanções, ficamos muito amarrados.”

Desafios da Transparência

Já na sexta-feira foi a vez da mesa de debate “Desafios da Transparência: um balanço dos 2 anos da Lei de Acesso à Informação”, realizada na Escola de Direito de São Paulo da FGV. O evento foi uma realização da Conectas, da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), da Transparência Brasil, da ARTIGO 19 e da FGV.

Juana Keitel, da Conectas, fez críticas aos órgãos públicos mais avessos à transparência, como é o caso da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo. Keitel falou sobre os pedidos de informação relacionados a 13 de junho, dia de maior repressão policial nos protestos de 2013. “Fizemos uma série de perguntas sobre a operação daquele dia. Após um longo tempo, entre pedidos não respondidos, respostas insatisfatórias e recursos nossos, levamos um choque ao ver que documentos foram classificados como secretos por 15 anos”, contou. Keitel disse, no entanto, que pretende continuar tentando ter acesso às informações daquele dia. “Pretendemos agora continuar a luta no Judiciário.”

Em seguida, a professora Marta Machado, do Núcleo de Estudos sobre Crime e Pena, da FGV, contou sobre a pesquisa realizada junto à Corregedoria da Polícia Militar de São Paulo sobre o que aconteceu com os policiais envolvidos no massacre do Carandiru, em 1992. “Queríamos saber se houve sanções disciplinares ou punições administrativas aos policiais que participaram daquela operação”, revelou. Após muita insistência e diversos pedidos negados, ela finalmente conseguiu ter acesso a documentos internos e pôde verificar que não havia nenhum procedimento administrativo aberto. “Recebemos 1.218 registros e só em 293 deles havia o motivo. Destes últimos, todos estavam ligados a problemas como bater continência errada, fardas mal postas, problemas relacionados à hierarquia. Não havia nenhuma sanção ligada à violação, dado que mostra a natureza da Polícia Militar.”

Falando em nome da Abraji, Marina Atoji discorreu sobre uma análise da cobertura da mídia sobre a LAI. Segundo Atoji, desde 2008, foram mais de 3.000 artigos e reportagens sobre a lei. A partir da aprovação da LAI, as menções cresceram. “A maioria das reportagens foi sobre divulgação de salários, monitoramento da implementação, uso da LAI para reportagem e casos de opacidade em órgãos públicos.”

Pela Transparência Brasil, Natália Paiva discorreu sobre pesquisa feita para conseguir informações sobre os 238 conselheiros de todos os tribunais de contas do país. Paiva relatou bastante dificuldades no trabalho, mas que obteve algum êxito. “Descobrimos que 64% dos conselheiros são ex-políticos, como deputados e secretários. E que ainda 20% deles têm ocorrências na Justiça”, disse.

A última a falar foi Paula Martins, que comentou sobre o Portal Livre Acesso, lançado pela ARTIGO 19, e que deve servir como uma referência na internet para assuntos ligados ao acesso à informação. O site também traz resultados da análise “Relatório de Monitoramento da LAI”. “Observamos que temos um avanço interessante do ano passado pra cá no Executivo. O número de pedido que não foram respondidos ou negados foram muito baixos”, disse Martins, que finalizou listando recomendações. “O Estado precisa investir mais na capacitação de seus servidores. Outra ação desejável seria cuidar mais da qualidade das respostas, e na aplicação de sanções aos que não cumprirem com a LAI”, concluiu.

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