Marcha pela liberdade reúne cerca de 5 mil pessoas

Cerca de 5 mil pessoas participaram de uma manifestação pela liberdade de expressão, em São Paulo, na tarde do último sábado, 28 de maio. O protesto foi motivado por repetidos casos de violenta repressão policial a diferentes manifestações e por uma decisão judicial que proíbiu a Marcha da Maconha. A ARTIGO 19 apoiou,  participou do ato e considera que o uso da violência contra os protestos públicos é incompatível com o estado atual da democracia e o Estado de Direito no Brasil.

A Marcha da Maconha – uma marcha pró-descriminalização do uso da maconha no país – estava originalmente programado para ocorrer em 21 de Maio, mas um Tribunal  do Estado de São Paulo proibiu a manifestação. O Tribunal considerou que a Marcha tinha o objetivo de difundir e estimular o uso de drogas – o que caracterizaria “apologia e incitação ao crime”. A decisão de proibição da Marcha é baseada no artigo 287 do Código Penal Brasileiro, que define como crime o ato de “fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de um crime”, e artigo 33 da Lei 11,343, que estabelece o crime de “induzir, instigar ou auxiliar alguém ao uso de drogas”.

Diante da ordem do Tribunal, os manifestantes decidiram manter a manifestação, no mesmo local e hora, mas a transform em uma Marcha para a Liberdade de Expressão. O protesto foi violentamente reprimido pela polícia. Os manifestantes enfrentaram gás lacrimogêneo e balas de borracha, que feriram um grande número de apoiadores. Cerca de 10 manifestantes foram presos, mas liberados mais tarde, no mesmo dia.

Como a violência policial tem sido relatado em várias ocasiões durante as manifestações públicas no Brasil, a manifestação do dia 28 de maio conseguiu reunir um grande número de pessoas (tanto pró e contra a legalização da maconha), todos protestando contra o que consideravam ser um ato de censura. Veja algumas imagens:

Em depoimentos colhidos pelo ARTIGO 19, alguns manifestantes expressaram sua indignação ao que eles consideram uma injusta repressão, construindo um clima de confronto durante as manifestações. Uma testemunha ouvida disse que ele nunca iria participar de qualquer manifestação, mesmo se simpático à causa, porque temia se machucar. Com essas ações, o governo envia uma mensagem de intolerância contra às vozes dissidentes e produziu um efeito inibidor sobre a liberdade de expressão.

A ARTIGO 19 considera que as decisões judiciais proibindo as marchas, a detenção de manifestantes e o uso da violência para dispersar manifestações pacíficas são atentados gravíssimos à liberdade de expressão e à liberdade de reunião, que são garantidos por tratados internacionais de direitos humanos e pela Constituição Brasileira.

A ARTIGO 19 pede aos tribunais brasileiros que revejam essas decisões restritivas, e pede aos governos estaduais para proporcionar as condições necessárias para garantir que todos possam expressar livremente suas opiniões e idéias, sem qualquer interferência, inclusive através de manifestações pacíficas, mesmo quando discute questões controversas.

ARTIGO 19 destaca a importância da formação para policiais em direitos humanos e treinamento para situações de conflito, em conformidade com os padrões  internacionais.

A repressão policial a manifestações públicas no primeiro trimestre de 2011

13 de Janeiro, São Paulo (SP)
Houve um confronto entre a polícia e manifestantes que protestavam contra o aumento nas tarifas de transporte público. A polícia atacou os manifestantes com balas de borracha e gás lacrimogêneo. Assista ao vídeo:http://www.youtube.com/watch?v=2ExBjlX8-wE

24 de Janeiro, Santo Antonio do Descoberto (GO)
O padre local teve de abrir as portas de sua igreja para proteger manifestantes contra o ataque pela polícia. Eles protestavam contra a corrupção do prefeito e por seus direitos básicos.

17 de Fevereiro, São Paulo (SP)
A Prefeitura de São Paulo foi palco do conflito neste dia. Mais uma vez, os protestos foram motivados pelo aumento nas tarifas de transporte público. Confrontos entre manifestantes e policiais ocorreram cerca de 300 metros do escritório da ARTIGO 19. A polícia bateu nos manifestantes, deixando muitos feridos feridos, incluindo três vereadores (veja a imagem abaixo).

17 de Março, São Paulo (SP)
Um mês depois, outra manifestação contra o aumento das tarifas de transporte público. Neste confronto, a polícia jogou gás lacrimogêneo em uma estação subterrânea do metrô. Participantes do protesto e não-apoiadores ficaram feridos.

18 de Março, Rio de Janeiro (RJ)
12 manifestantes foram presos durante a visita do presidente Barack Obama ao Brasil.

23 de Março, Niterói (RJ)
Desabrigados (vítimas de inundações) ocuparam a Câmara Municipal para protestar contra os atrasos no pagamento dos fundos de assistência social. O spray de pimenta foi usado até mesmo contra crianças:

Marcha da Maconha

As Marchas não tinham a intenção de difundir ou incentivar o uso de drogas. Em vez disso, tinham a intenção de propor mudanças na legislação nacional. Os manifestantes não pretendem distribuir produtos ilegais ou incitar a usuários de drogas e vendedores, eles queriam simplesmente expressar um ponto de vista. Liberdade de expressão é um direito humano fundamental que protege a livre circulação de opiniões e idéias nas sociedades. Ele inclui a liberdade de cada pessoa para expressar idéias sobre temas polêmicos, incluindo aqueles que são considerados imorais ou ilegítimos por alguns setores da sociedade.

O argumento de que debater a legalização da maconha é uma conduta criminosa, por si só – por caracterizar apologia ou instigação ao crime – é completamente inadequado. Há uma diferença fundamental entre emitir uma opinião e incitar outros a cometer um crime. A criminalização de determinadas condutas em sociedade exige um debate público. Só uma discussão ampla sobre estas questões, com a participação efetiva de grupos variadas visões e opiniões, pode legitimar a criminalização ou descriminalização de certos atos.

Além disso, o conceito de “apologia ao crime”, usado para deter alguns manifestantes e proibir as passeatas, é demasiadamente vago para justificar uma restrição à liberdade de expressão. Liberdade de expressão só pode ser sujeita a restrições quando um discurso causa perigo real, concreto e iminente para a ocorrência de um crime.

 

 

Postado em

Icone de voltar ao topo